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joanilio teixeiraQuando, em meados da década de 1960, o acanhado e curioso jovem Joanilio Rodolpho Teixeira, de Ubá, sul de Minas, principiava seus estudos em Economia na Universidade Federal de Juiz de Fora, não deixou de aproveitar o tempo livre para iniciar o que veio a ser o seu destino, vida e formação: uma pródiga e renomada carreira de docência e pesquisa.
Em uma cerimônia lotada de colegas, admiradores e familiares, onde recebeu o título de professor emérito da Universidade de Brasília, os presentes assistiram, nesta terça-feira, 28 de agosto, a um breve panorama de um impressionante percurso acadêmico de padrão internacional. São nove pós-doutoramentos, inúmeras docências como professor visitante, mais de uma centena de publicações, dezenas de premiações, e organização de colóquios internacionais e experiências em nada menos que 24 universidades em todo mundo.

Foi enquanto cursava a graduação, em 1964, que Joanilio Teixeira atuou pela primeira vez como professor, lecionando matemática no Instituto Granbery, onde também fora aluno no curso científico. A partir dessa iniciação, veio o que chamou de “improvável guinada” – momento que divisou a vida do então rapaz tímido e que se confessava amante da literatura, artes, história, filosofia e partidas de xadrez: “Foi ali que descobri que o ensino era o meu caminho a trilhar”.

Após o Hino Nacional, executado em piano e voz pelas professoras de Música da UnB Vânia Marise e Irene Bentler, Marcos Maciel Formiga, coordenador-geral de cooperação internacional do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e professor do campus, encarregou-se de apresentar a trajetória acadêmica e profissional de Joanilio Teixeira, iniciada há 44 anos e ainda em “vigoroso e efetivo andamento”. Seus feitos acadêmicos, científicos e profissionais são tão numerosos que foram necessários mais de 20 minutos somente para expor sucintamente uma carreira tida como “recordista”, tamanhas as contribuições em mais de 20 universidades e centros de pesquisa no Brasil, Europa e Estados Unidos.

Somado às contribuições à UnB – onde ingressou em 1977 e foi professor titular por 20 anos, tendo ainda colaborado na implantação do doutorado do Departamento de Economia –, seu percurso acadêmico e científico motivou a indicação de seu nome para o título de professor emérito, honraria concedida a docentes aposentados. Desde a graduação em Juiz de Fora, em 1966, Joanilio passou por inúmeras instituições de ensino e pesquisa, seja cursando mestrado e doutorado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e Universidade de São Paulo (USP), respectivamente, quanto nove pós-doutoramentos – Cambridge, Harvard, Berkeley, London School of Economics, Sorbonne, Stanford, Milano, Cepremap-Paris. Atuou ainda como professor-visitante em Portugal, França, Itália, Estados Unidos e Suíça.

PIONEIRISMO – Marcos Maciel Formiga destacou ainda o talento pioneiro de Joanilio, ao apontá-lo como responsável pela idealização e fundação da Sociedade Brasileira de Econometria e criação da Revista Brasileira de Econometria, no final da década de 1970. Sublinhou também a importância de seu nome para o processo de “internacionalização do programa de pós-graduação em Economia da UnB”, a partir de sua atuação como chefe do Departamento entre 1988 e 1990 e em posteriores iniciativas de colóquios internacionais na instituição.

A aposentadoria compulsória em 2011, derivada do fato de ter completado 70 anos, não constituiu obstáculo para Joanilio prosseguir com suas atividades universitárias. Como lembrou Maciel, “ele continua vinculado à UnB como professor e pesquisador por simples interesse institucional”. Para o colega, “sua eminente carreira internacional o credencia como um dos mais destacados e respeitados economistas brasileiros da atualidade”.

ALÉM DA ACADEMIA – Para apresentar o homem e amigo Joanilio, Marcos Maciel Formiga valeu-se de depoimentos pessoais e testemunhos de familiares para dimensionar “a figura rica e interessante que exista para além da academia, sem dúvida, um cidadão brasileiro, nacionalista, filho, esposo e pai exemplar”.

Em meio a aplausos e a uma fala pausada pela emoção, Maciel surpreendeu Joanilio trazendo as orgulhosas declarações de sua esposa e filhos. Segundo a socióloga e mulher de Teixeira, “desde jovem chamava atenção sua ardente busca pelo conhecimento, por meio de uma disciplina férrea e grande dedicação aos estudos”, aproveitando para agradecer os filhos que souberam entender e colaborar em seu propósito “de alcançar um ideal humanista e uma carreira acadêmica ímpar”. Para a filha Adriana, seu exemplo maior foi de “amor incondicional, conduta ilibada, determinação e generosidade, porto seguro nos momentos mais difíceis”. “É o reconhecimento a uma dedicação de toda uma vida profissional em prol de seus alunos, da pesquisa científica e da própria Universidade de Brasília”, disse.

Já seu filho Rodolfo, sociólogo e cientista político, agradeceu “o privilégio de acompanhá-lo como professor e tirar tantas lições dessa bela passagem pela UnB”, destacando que “seu determinado e suado caminho da heterodoxia é admirável tanto pelo respeito às diferenças, quanto pelo domínio das emoções e pela devoção apaixonada pela atividade acadêmica”.

Para compor a apresentação de Joanilio, Marcos Maciel Formiga fez questão também de imprimir seu próprio testemunho pessoal na homenagem: “Conheci-o no final dos anos 70, onde pude atestar que, ao lado da figura de disciplina férrea, havia um personagem mais descontraído, com humor e fleuma plenos de picardia”. Contou também que Teixeira “não se separava de seu permanente instrumento de trabalho e de lazer: o cachimbo, cuja chama abastecia suas reflexões metafísicas enquanto facilitava o seu lado de exímio econometrista, expert em métodos quantitativos aplicados à Economia”. Aproveitou ainda para mencionar que algumas de suas grandes paixões – música, vinho, futebol e partidas de xadrez – somente enriquecem a figura humana de “inegáveis competência, talento e grandioso legado”.

MÚSICA E EMOÇÃO – Após o canto de lieder - poemas musicados – de Schubert e Beethoven, o professor Joanilio Teixeira iniciou o seu pronunciamento agradecendo a homenagem e conferindo à UnB um grande relevo afetivo:  “Estou nessa querida instituição desde 1977, e, como servidor público, dediquei todo meu esforço de aperfeiçoamento, fiz amizades e a ela, que considero a minha casa materna, dedico os meus melhores sentimentos”.

O professor aproveitou para lembrar que 2012 é um ano especial pelo fato de a UnB estar completando 50 anos. “Sou o segundo economista, nesse meio século de atividades, a receber o título de professor emérito, e fico muito feliz em ter colaborado com a consolidação do departamento a partir da minha formação de padrão internacional”, disse referindo-se a Charles Miller, que foi reconhecido como professor emérito em 2007.

Com simpatia e simplicidade, Joanílio considera que “homenagens e distinções a um servidor público implicam, na maioria das vezes, mais deveres do que privilégios”, aproveitando para lembrar que, desde cedo, sua paixão pela matemática e ciências sociais tem-no acompanhado, contribuindo para conformar seu ideário e ensinamentos.

PERCURSO CRÍTICO - Em seu pronunciamento, ao se referir à sua primeira experiência de docência, contou que “foi naquela distante época, em busca do tempo perdido, acompanhando as idéias de Proust, que me encontrei com três grandes pensadores, em uma espécie de encontro marcado: Marx, Freud e Bertrand Russell”. De acordo com ele, foi nessa mesma época que descobriu que “os cursos de graduação eram inadequados para uma carreira promissora. Felizmente tem havido vários progressos nesse ensino, mas há muito a caminhar. No caso dos economistas, a formação tem sido excessivamente tecnocrática”.

Em tom bem-humorado, relatou que, quando cursava o doutorado na USP, jamais havia visto um PhD: “Imaginei que todos os PhDs eram gênios, e a minha decepção foi saber que não era nada disso; foi aí que pensei que também poderia ser um”.  A partir dessa constatação, disse se valer da seguinte máxima lançada por Lênin: "É preciso sonhar, mas com a condição de crer em nosso sonho, de observar com atenção a vida real, de confrontar a observação com nosso sonho, de realizar escrupulosamente nossas fantasias".

Outra passagem de seu pronunciamento que mereceu aplausos foi quando declarou que resistiu a convites internacionais, ainda na década de 1970, em ocasião a seu primeiro pós-doutorado em Cambridge, na Inglaterra. "Foram recursos públicos que financiaram a maior parte do meu processo de aprendizagem".

Para o professor, o seu percurso foi fundamental para compreender o que julga hoje fundamental: “Os economistas nos explicam o processo de produção e distribuição sob determinadas condições, porém o que eles tendem a não explicar é como se produzem essas condições, sendo esse o processo dialético e dinâmico da Economia”.

Ainda em tom crítico, contou que começou efetivamente a entender o que era uma carreira acadêmica no ITA, onde compreendeu que “ensino sem pesquisa é um ato falho”. Segundo ele, “embora matemática e métodos quantitativos sejam fundamentais na formação de um moderno economista, é preciso afastar a visão ingênua de que economia é uma ciência não neutra, ideológica, e a ideologia sempre estará presente na análise e construção de modelos”.

ÉTICA E CORTESIA - Para o reitor José Geraldo de Sousa Júnior, “a homenagem assume uma significação especial no contexto celebratório do jubileu da UnB. Para ele, “o título é uma alta distinção não só para o agraciado, mas para a própria universidade, que se auto-homenageia ao conferir tal reconhecimento”.

Em tom deferente e bem-humorado, ao se referir à postura coerente e ética e ao “comprometido e esmerado percurso acadêmico” de Joanilio, aproveitando para “ombrear com a erudição do homenageado”, recorreu ao pensamento de Ortega y Gasset, o qual recomenda temperança e cortesia no agir acadêmico do intelectual, mas de modo a se combinar com sua ética”, complementando que “a clareza é a cortesia do pensador”.

Em consonância com o pronunciamento do professor emérito, o reitor também criticou o "otimismo delirante" do personagem de Voltaire, aproveitando também para invocar Marx e endossar que "a riqueza das nações não é algo abstrato, mas uma instância que pressupõe valores morais, não podendo jamais perder de vista o horizonte humano”.

Ao mencionar a atitude de Joanilio Teixeira de permanecer, após sua aposentadoria formal, como professor voluntário do quadro da universidade, José Geraldo ressaltou: “A UnB agradece em prosseguir iluminada por esse admirável exemplo de homem, cientista e intelectual, de paradigmas e percurso impecáveis”.

Diante de sua mãe de 93 anos, que assistia à cerimônia junto a outros familiares, e do alto de sua experiência como “economista heterodoxo e cidadão do mundo”, como se auto-intitula, Joanilio Teixeira finalizou, afirmando que “nenhuma premiação se equivale a esse título”, ilustrando como se sente a partir das palavras de Russell em sua autobiografia: “isso tem sido a minha vida, e creio que ela tem sido digna de ser vivida”.

UnB Agência