
Na última reunião, no final de abril, o Copom elevou a Selic para o patamar de 9,5% ao ano, depois de quase nove meses de manutenção dessa taxa em 8,75% ao ano e uma tendência de queda desde dezembro de 2008. A esse respeito, cabem algumas reflexões relevantes.
Primeiro, no regime monetário de metas de inflação, em vigor no país desde o final dos anos 1990, a taxa básica de juros é o principal instrumento à disposição das autoridades monetárias (leia-se, o Banco Central, e em especial, o Copom) em defesa da estabilidade monetária. No Brasil, essa taxa básica é das mais elevadas do mundo, uma vez que nos Estados Unidos a taxa básica situa-se atualmente entre zero e 0,25% ao ano e, na zona do euro, está em torno de 1% ao ano. Por isso, a recente decisão do Copom é, de alguma forma, aparentemente incompreensível para a maioria dos brasileiros.
Segundo, como a Selic é uma taxa básica, a partir da qual se forma toda a cadeia de juros na economia, e, como, ademais, o spread bancário brasileiro (a diferença entre o custo básico do dinheiro e as taxas de juros cobradas nos empréstimos das instituições financeiras) é extremamente elevado, um aumento da Selic resulta em maiores taxas finais cobradas pelas instituições financeiras em todas suas operações ativas de empréstimos e financiamentos, tanto para empresas, que pagam atualmente uma média de juros anuais de 26%, como para pessoas físicas, que enfrentam uma taxa anual média de juros de 41% ao ano, segundo o Banco Central.
Com taxas tão altas, fica difícil explicar porque mais de 25 milhões de pessoas físicas têm hoje dívidas bancárias, e mais de 2,4 milhões de empresas possam tomar empréstimos a esses custos e ainda obtenham rentabilidade. Se essas são questões complicadas para os brasileiros, para os estrangeiros elas são inexplicáveis!
Entre as questões que ficam, portanto, cabe destacar as seguintes: a) Por que o Copom elevou essa taxa? Por que a mantêm tão elevada? Finalmente, porque o Banco Central não regula adequadamente o sistema financeiro, de forma a reduzir o spread e permitir aos tomadores de empréstimos uma taxa de juros mais próxima da média mundial?
Genericamente, vejamos algumas respostas. Primeiro, a Selic foi aumentada para enfrentar pressões nos preços na economia (o IPCA no último mês indica aumento da inflação anualizada para 5,4%), decorrentes de crescentes gastos nos últimos meses, tanto por pessoas físicas (resultantes de crédito mais fácil, aumentos salariais e estímulos tributários ao consumo de bens duráveis e à aquisição de materiais de construção), como por parte do Governo (aumento de custeio, da folha de pagamento, de gastos de transferências, como o de bolsa família, bem como de algum incremento nas despesas de investimento e do seu potencial de acréscimo em um ano eleitoral). Dessa forma, a elevação da Selic tem o objetivo de manter a trajetória da inflação dentro da faixa da meta média de 4% estabelecida para 2010.
Segundo, a autoridade monetária aumentou a Selic porque, nos últimos meses, a execução das contas do Governo Federal (diferença entre as receitas e as despesas primárias), nos últimos dois meses, indica uma deterioração, com aumento de déficit primário, e elevação da dívida pública do Tesouro em cerca de 1,6% do PIB. Nessas condições, a atuação do Banco Central foi, de certa forma, compensatória à atuação expansiva dos gastos públicos em comparação com a já elevada receita tributária.
Em terceiro lugar, está mais do que na hora de o Banco Central agir de forma eficaz na regulação do sistema financeiro e reduzir o elevadíssimo spread bancário, de forma a tornar as taxas de juros finais no Brasil menos absurdas.
José Carlos de Oliveira
José Carlos de Oliveira é professor do Departamento de Economia da UnB. Atua nas áreas de política econômica brasileira e finanças públicas. Já trabalhou no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco Mundial (Bird).