
A exposição de fotografias de Pierre Verger integra, ainda, o FotoRio 2009 e o Museu Histórico Nacional acolhe o seminário “Fotografia e História”, de 2 a 4 de junho, das 10h às 12h. Com curadoria de Ana Maria Mauad, o seminário inclui três mesas redondas, com os temas “Guerra do Paraguai” (dia 02), “Grandes Expedições Científicas” (dia 03) e “Pierre Verger, um olhar nômade na Espanha de 1935" (dia 04), com Jesús Cañete Ochoa, um dos curadores da exposição, e Silvana Louzada, fotógrafa e doutora em comunicação, com mediação de Milton Guran, curador do FotoRio 2009.
Ambas as exposições serão abertas ao público no dia 4 de junho, às 12h30m.
Exposição “Pierre Verger - Andalucía, 1935”
Promoção: Embaixada da Espanha, Instituto Cervantes do Rio de Janeiro e o Centro Cultural da Espanha em São Paulo/AECID - Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento.
Dando continuidade à itinerância por cidades brasileiras, a exposição apresenta 70 fotografias em branco e preto, no formato 60x73cm, retratando a vida cotidiana da região de Andalucía no verão de 1935, nas vésperas da guerra civil espanhola.
Pierre Verger, fotógrafo, etnólogo e viajante incansável dedicou sua vida e obra fundamentalmente ao estudo das sobrevivências culturais das populações da África Negra em seu continente de origem e na diáspora africana na América. Antes de começar suas pesquisas sobre as culturas africanas, pesquisadores da Fundação Ceiba encontraram no arquivo do fotógrafo uma ingente quantidade de imagens da Espanha, especialmente de sua estadia em Andalucía e, posteriormente, nos diversos países ibero-americanos.
Esta mostra tem um enorme valor testemunhal porque, surpreendentemente, alguns registros fotográficos de grande qualidade de um autor tão transcendental (reconhecido internacionalmente, além de estudioso das culturas africanas, como um fotógrafo excepcional), passaram despercebidos e praticamente desconhecidos até que foi possível realizar esta exposição pela primeira vez em Sevilha, no ano de 2006, e planejar sua posterior itinerância.
A Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento - AECID executa seu trabalho no âmbito de cooperação cultural em Ibero - América através de uma rede de Centros Culturais que se encontram nas principais capitais. A agência realiza uma intensa programação em associação com uma ampla gama de instituições locais e organizações da sociedade civil. A ênfase da atividade não está na mera promoção da cultura espanhola no país escolhido, mas sim no apoio a iniciativas institucionais ou privadas que implicam em ações locais e assuntos de interesse comum, especialmente quando estes possuem possibilidades de incidência no âmbito regional, como pode ser o espaço MERCOSUL ou, diretamente, o espaço ibero-americano. Também é uma prática comum interna a produção de projetos em rede que envolvem vários Centros da rede de cooperação cultural espanhola, como é o caso da exposição "Pierre Verger – Andalucía 1935"
Exposição "Cartazes da Guerra - 1936 - 1939"
Promoção: Instituto Cervantes e Fundação Pablo Iglesias, da Espanha.
Após passar pela França, Itália, Alemanha e Suécia, chegam ao Brasil 95 cartazes do conturbado período da guerra civil espanhola, que proporcionam a oportunidade de uma reflexão sobre o confronto armado, considerado um dos mais sangrentos do século XX, além de importante prévia da Segunda Guerra Mundial.
Testemunhos das mensagens e idéias republicanas e socialistas, os cartazes representam algumas das tendências artísticas mais importantes daqueles anos, como, por exemplo, o construtivismo russo. O material reflete o drama histórico e os sentimentos humanos envolvidos durante o avanço fascista das tropas de Franco na Espanha que desencadeou uma das ditaduras mais brutais da Europa, responsável pela morte de artistas como o poeta Federico Garcia Lorca, mas também por obras primas, como a Guernica, de Picasso.
Considerados um meio de comunicação eficaz, definidos inclusive como "um grito na parede", os cartazes abordam temas essencialmente políticos, como a obrigatoriedade do alistamento militar e a cautela excessiva com potenciais inimigos. Serviam também de advertência diante dos abusos em situações de guerra e foram igualmente utilizados em campanhas de saúde, higiene e educação. Com a Segunda Guerra Mundial, o cartelismo passou a ser uma mídia fundamental de propaganda em diversos países, tendo envolvido um autêntico exército de artistas gráficos, desenhistas e pintores e alcançado elevados níveis de qualidade e valor estético.
Os cartazes expostos no MHN integram uma preciosa coleção de dois mil itens, formada ao longo dos anos pela Fundação espanhola Pablo Iglesias, e foram minuciosamente selecionados para propiciarem um panorama da variedade dos temas em voga, dos artistas e das tendências artísticas abordadas pelos cartazes da época da guerra civil espanhola.
Entre os artistas incluídos, há desenhos de espanhóis renomados - como Bardasano, Huertas, Melendreras, Ballester, Espert, Monleón, Renau, Cristino Mayo, Briones, Oliver, Garay -, junto a obras anônimas, mas de indiscutível qualidade artística.
Desde sua aparição no século XIX, o movimento artístico que ficou conhecido como “Cartelismo” (arte do cartaz) converteu-se rapidamente num meio privilegiado para transmitir todos os tipos de ideias e informações à sociedade dos países europeus. Sua produção foi particularmente importante na Espanha dos anos 30 do século passado durante o período da república e, especialmente, nos anos da guerra civil espanhola.
Partidos políticos, sindicatos e diferentes entidades públicas perceberam a eficácia do instrumento para expor seus pontos de vista e comunicar seus ideais ao povo de maneira rápida e eficaz. Além de evidente ferramenta de propaganda política que durante algum tempo diminuiu para os críticos o valor artístico deste vasto material, estudiosos do tema reconhecem hoje a qualidade deste material, que refletiu as mais diversas tendências estéticas das vanguardas que floresceram naquele período.
Não por acaso, os cartazes são assinados por pintores, desenhistas e artistas gráficos que tiveram na guerra a motivação necessária para criar e que chamaram a atenção de personalidades relevantes como o escritor britânico George Orwell e o correspondente de guerra soviético llya Ehrenburg.
Críticos de arte são quase unânimes na afirmação de que a arte atrelada a causas políticas geralmente recai em manifestações já consolidadas e tradicionais, enquanto as vanguardas buscam justamente se estabelecer na mão oposta ao poder vigente. A explicação desta exceção histórica justifica-se na liberdade dos artistas envolvidos no repúdio republicano ao avanço fascista europeu e na contundência destas mensagens, além da apurada técnica na produção dos cartazes.
MAIS INFORMAÇÕES: “Pierre Verger, um homem livre”.
Texto de apresentação dos curadores Jesús Cañete Ochoa e Jesús Cosano Prieto
Talvez o mais singular de Pierre Verger é que se trata de um dissidente que soube se afastar de tudo aquilo que todos haviam previsto que ele viesse a ser.
Verger abandonou a acomodada vida de um burguês da Paris dos anos trinta para percorrer o mundo fotografando. Um viajante incansável que, aos quarenta e quatro anos, fascinado pela leitura do romance Jubiabá de Jorge Amado, escolhe como residência permanente Salvador, na Bahia, “que matou minhas saudades das outras terras”, para converter-se logo depois em uma ponte, um mensageiro entre as culturas dessa cidade do norte do Brasil e a antiga Costa dos Escravos na África. Uma concepção livre da vida que leva à descrença, “não tenho espírito religioso”, declara ao iniciar-se no africano culto ioruba e trocar, com sua iniciação, inclusive o próprio nome, “morra Pierre Verger, nasça Fatumbi”.
Depois de seu “renascer”, em meados dos anos 50, o fotógrafo dá lugar ao pesquisador da presença africana no Brasil, “o que mais me interessou não foram tanto as religiões, mas sim o papel que estas crenças têm para dar dignidade aos descendentes de africanos”; trabalhos – alguns apoiados pelo grande historiador Fernand Braudel - cujo indiscutível valor levam-no a obter o doutorado honoris causa pela Universidade de Sorbonne.
Pierre Verger chega à fotografia em 1932, em um momento crucial de sua existência. Tem trinta anos e está cansado da sociedade parisiense; sua mãe, último vínculo familiar, acaba de morrer. Decide dar uma reviravolta em sua vida e dedicar-se à fotografia. Entre 1932 e 1935 percorre um amplo périplo que o levará a Rússia, Taiti (onde passa todo o ano de 1933), Nova York, Los Angeles, China, Japão, Filipinas... e Espanha. Com sua Rolleiflex 120 e montando uma bicicleta, Pierre Verger chega à Espanha em março de 1935 e aí percorre cerca de 3.500 quilômetros: “entrei por Port Bou, atravessei a Catalunha, com uma breve parada em Barcelona para ver as extraordinárias realizações arquitetônicas de Gaudí, e continuei pedalando ao longo da costa do Mediterrâneo, passando por Valência, Alicante, Elche, onde eu parecia estar em um oásis dos desertos da África. Mas foi em Andaluzia que permaneci mais tempo. Granada, a Alhambra, os Jardins do Generalife e os bairros ciganos do Albaicin; Córdoba e sua catedral violentamente inserida no meio da antiga Mesquita, as touradas; a Semana Santa em Sevilha onde pude ver o fervor quase bárbaro que causava a passagem, pelas ruas estreitas do centro da cidade, da Virgem da Macarena ou do Jesus do Grande Poder. Ainda era a Espanha de antes da Guerra Civil, que já estava muito perto e que ia estourar alguns meses mais tarde”.
A estada de Verger na Espanha coincide com o final do segundo biênio republicano, o chamado “biênio negro” caracterizado pelo retrocesso social e pelas dificuldades dos grupos políticos de centro-direita, vencedores das eleições de 1933, em formar um governo estável. A polícia daquela época manteve uma permanente vigilância e repressão de todas as atividades consideradas como suspeitas de subversão política. Pierre Verger foi preso em Sevilha sob a acusação de ser um espião alemão. Conta assim essa experiência: “O regime de Gil Robles, que ocupava o poder na Espanha estava em estado de alerta e cheio de desconfiança, o que me valeu a seguinte desventura: Fui interrogado no momento em que tirava uma fotografia de um lugar pitoresco do bairro de Triana (a Igreja de Santa Ana), sem perceber que em um pedaço do muro havia uma inscrição que dizia Abaixo o fascismo e Liberdade para Tahelman, junto ao desenho de um homem com o punho levantado. Um policial me perguntou: O senhor é alemão? Eu respondi que não, algo que pareceu não convencê-lo. Mostre seus documentos! ordenou-me. Eu lhe mostrei meu passaporte. Como?, gritou irritado: É alemão e tem coragem de viajar com documentos franceses! Siga-me, subversivo! e me levou para a delegacia. Não me ajudava em nada que meu passaporte tivesse sido emitido em Hong Kong, para substituir o que me haviam roubado em Cantão um ano antes. Nenhuma das minhas explicações conseguiu convencer o delegado de polícia sobre minha verdadeira nacionalidade. Insistia que o meu aspecto era de um alemão e que estava vestido como alemão.
E a verdade é que viajando de bicicleta eu usava uma calça curta, algo que não era muito comum naquela época. Depois fui encarcerado em companhia de uns trinta cidadãos andaluzes que tinham sido detidos praticando o ‘três em um’ e outros jogos de azar proibidos por lei. Quando foram libertados, pedi a um deles que avisasse o Cônsul da França; ele veio à delegacia e teve a bondade de certificar que meu aspecto era muito francês. Depois me puseram em liberdade. Esta aventura teve conseqüências muito gratas, pois aqueles com quem eu tinha partilhado a prisão durante dois dias, exerciam atividades que faziam com que estivessem muito tempo nas ruas de Sevilha, ou porque eram engraxates, ou porque tinha que vigiar as atividades galantes e remuneradas de suas amigas do coração, ou porque continuavam praticando os jogos de azar. Eu me encontrava com um certo número deles todos os dias. Sentíamo-nos ligados pelo mesmo cativeiro e estávamos eufóricos por estarmos livres de novo. Isso nos levava a celebrar nossos encontros brindando com um excelente vinho local chamado manzanilla. Eram verdadeiros cavalheiros, nos oferecíamos mutuamente rodadas de copas e como me encontrava diariamente com uns vinte dos meus antigos companheiros, o resultado foi que faltou pouco para voltar à delegacia por fazer algazarra certa noite em avançado estado de embriaguez”.
Este contratempo, como se depreende do relato de Verger, foi aproveitado para envolvê-lo no ritmo de Sevilha, misturando-o com mais confiança ao mundo popular. Sempre soube que “é necessário que o fotógrafo seja espectador antes de fazer seu trabalho: o bom fotógrafo nada mais é que um voyeur sublimado que deve viver com as pessoas antes de fotografá-las, para que se acostumem com sua presença, olhando sem querer penetrar na razão das coisas”.
Depois de sua estada em Sevilha, lembra Verger que continuou seu caminho em direção a Málaga, “onde um excesso de vinho e umas sardinhas assadas me levaram mais para a sesta do que para continuar pedalando pelas estradas cheias de sol que iam para Jerez de la Frontera”. Dali, Verger regressa a Paris. Naquele mês de maio de 1935 conhecerá duas pessoas chaves em sua vida: o antropólogo Alfred Metraux e o editor Paul Hartmann. O catálogo En España, impresso em junho de 1935, é a primeira publicação de Pierre Verger e será editada por Hartmann em Paris, primeira colaboração com essa casa editora com a qual manterá uma relação de mais de trinta anos.
Anos mais tarde, na apresentação do catálogo Le Messager, Photographies 1932-1962, que reúne uma antologia de suas fotografias, Pierre Verger escreve que as duzentas imagens que ele contém foram tiradas em um centésimo de segundo, pelo qual o referido catálogo representa apenas dois segundos de sua existência, dois segundos que, postos no papel, passam “do efêmero ao permanente”.
A fotografia é para Verger o testemunho do que acontece fixado em um instante, “que pode ser sentido por outros de forma espontânea, revelando uma sensibilidade comum que dificilmente pode-se expressar”.
Pierre Verger é um fotógrafo interessado no ser humano, interessado em apresentar sua riqueza, sem tratar as pessoas que fotografa “como se fossem coleópteros ou plantas exóticas”. Não rouba uma foto, nem a faz prisioneira de uma idéia pré-concebida. Ao contrário do que pensava Levi Strauss, Verger confia na fotografia e com ela constrói diálogos. Uma forma de entender a fotografia que ele explora em seu primeiro trabalho de pesquisa, Dieux d’Afrique, onde as imagens tomadas na brasileira Bahia e na africana Costa dos Escravos se apóiam em breves textos que demonstram as semelhanças de um lado e de outro do Atlântico. Verger fotografa com o corpo inteiro; do ponto de vista fotográfico nos diz, “sou incapaz de fazer uma composição, incapaz de exigir: olhe aqui”. Por seu temperamento de fotógrafo é “uma pessoa que registra as coisas e que não explica”. Porque “nunca um pai de santo [sacerdote do culto ioruba], digno de seu nome, mostra as coisas, demonstra como se faz. Mas não explica”.
O olhar de Verger, sempre amável, percorre apaixonadamente Andaluzia e muito especialmente uma cidade: Sevilha, à qual em suas posteriores pesquisas, encontrará como centro do tráfico negreiro para as Américas. Estas imagens são um testemunho fundamental para conhecer o cotidiano daqueles dias, a vida social e política retratada nas páginas da imprensa diária que noticiava coisas como a visita à Feira de Sevilha do Presidente Lerroux, ou a recepção carinhosa ao Betis Balompié que nesse ano, depois de uma brilhante atuação nos estádios da Espanha, ganhou o Campeonato Nacional da Liga. Também a preocupação pela seca e a praga de gafanhotos que assolavam a região, e também a passagem por Andaluzia da Volta Ciclística à Espanha, que nesse ano de 1935 celebrou sua primeira edição.
A forma que Verger tem de conceber a fotografia está presente nas imagens de Andaluzia que faz na primavera de 1935 e que podem ser vistas nesta exposição.
Museu Histórico Nacional
Praça Marechal Âncora, s/nº
Próximo à Praça XV
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Agendamento de grupos escolares: tel 21-25509260/1
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Ingresso para exposições do Museu Histórico Nacional:
R$ 6,00 (seis reais)
Estão isentos de pagamento (mediante comprovação): crianças até cinco anos de idade; sócios do ICOM-International Council of Museum; funcionários do IPHAN; alunos e professores das escolas públicas federais, estaduais e municipais; brasileiros maiores de 65 anos; guias de turismo e estudantes de museologia. Alunos agendados da rede particular de ensino e brasileiros maiores de 60 anos e menores de 65 anos pagam a metade do valor. Aos domingos, a entrada é franca.