do Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro (MN/UFRJ), é realizado em parceria com diversas instituições internacionais e nacionais e resultou na publicação de um artigo na renomada revista científica Science, divulgado nesta quinta-feira, 30 de novembro, com o título Egg acumulation with 3D embryos provides insight into the life history of a pterosaur.
“Até então, só se tinha registro científico de quatro descobertas de fósseis de ovos de pterossauro no mundo, dois na Argentina e dois na China”, explica Kellner, que desde 2004 viaja anualmente a China para participar de pesquisas paleontológicas. Os ovos encontrados são da espécie de pterossauro Hamipterus tianshanensis, que viveu há 120 milhões de anos, durante o período Cretáceo Inferior. “Até agora, confirmamos 215 ovos, ao analisarmos um bloco de rocha de 3,2 metros quadrados. O número total estimado nesse bloco é de 300 ovos. Nunca antes foram encontrados tantos ovos juntos em uma área tão pequena”, completa o paleontólogo, que é Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ,.
A espécie Hamipterus tianshanensis foi descrita pela primeira vez por Kellner e colegas chineses em 2014, em artigo publicado na capa na revista americana Current Biology, uma das principais publicações internacionais na área de ciências biológicas. Exímios voadores, esses animais tinham uma envergadura de 1,5 a 3,5 metros, considerando as extremidades entre uma asa e outra, e dentes bem desenvolvidos. Ele conta que o local da descoberta é uma região desértica nos arredores na cidade de Hami, localizada na província de Xinjiang.
“Descobrimos, ao analisarmos uma seção de rocha de 2,2 metros, oito níveis diferentes com concentração de ossos de pterossauros, sendo que em quatro deles tinha ovos. O fato de existir essas camadas cumulativas significava que os animais deviam retornar ao mesmo local para ocasionalmente colocar os seus ovos. As fêmeas faziam desse lugar uma colônia de nidificação para a postura sazonal dos seus ovos”, detalha.
Também foi possível entender porque tantos ovos foram preservados no mesmo local. “Com base em dados geológicos, verificamos que chuvas torrenciais faziam com que os rios transbordassem e reunissem em um só lugar, com a força da água, os ovos postos naquela área, que horas depois eram soterrados juntos pelas intempéries. Então, todos os ovos se concentraram em um espaço comparativamente pequeno, como o que acabamos de estudar”, explica Kellner.
Outro fator que chamou a atenção é a delicadeza dos ovos de pterossauro. “Os ovos de pterossauro costumam ser muito frágeis, porque têm casca mole, já que a parte externa da casca mais dura, mineralizada, de carbonato de cálcio, é fina, e a parte interna, membranosa. Assim, eles deformam mas não quebram, como os ovos de dinossauro, por exemplo, que são muito mais resistentes e, por isso, comuns no registro fossilífero. Raridade são os ovos de pterossauro", detalha.
Junto com a descoberta dos ovos, veio mais uma boa surpresa para os pesquisadores. Foram encontrados embriões de pterossauros em um raro estado de boa preservação – em dimensões tridimensionais (3D). “Encontramos restos de 16 embriões de Hamipterus tianshanensis. Eles não estão completos, mas estão preservados em 3D, o que permitiu um estudo mais aprofundado. Pudemos fazer análise de tomografia computadorizada para ver o interior do ovo de alguns embriões e estudar como se deu o desenvolvimento deles”, destaca. “Esse é um grande diferencial dessa descoberta.”
A partir dessas análises, a equipe percebeu uma característica curiosa. Os ossos vinculados ao voo (o úmero) era pouco desenvolvido nos embriões de pterossauros prestes a nascer. Por outro lado, o osso fêmur, das pernas do animal, eram bem formados. “Chegamos à conclusão que esse filhote podia caminhar, mas não voar, logo depois que nascia. Isso indica que o cuidado parental, que podia ser paterno ou materno, era indispensável para a sobrevivência e o desenvolvimento dessa espécie de réptil voador. Essa é uma descoberta interessante, porque antes se acreditava que eles eram como os demais répteis que conhecemos hoje, como o jacaré, que já tem maior independência depois que nasce. Agora sabemos que eles não podiam voar logo depois do nascimento, pelo menos na espécie Hamipterus tianshanensis, graças ao estudo dos fósseis desses embriões”, conclui o pesquisador.
A pesquisa também foi contemplada, no Brasil, com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e foi financiada, em grande medida, na China, pelo Instituto de Paleontologia e Paleoantropologia de Vertebrados (IVPP), localizado em Pequim, e pelo Museu de Hami. “Hoje, vivemos em uma situação difícil para a ciência no Brasil. É preciso manter um financiamento contínuo das pesquisas para podermos produzir, e até para podermos estabelecer parcerias internacionais. A China, por exemplo, tem um número considerável de artigos na área de paleontologia publicados em revistas de peso, como a Nature e a Science, pois conta com fomento contínuo”, ponderou.
Além de Kellner, assinam o artigo os pesquisadores brasileiros Taissa Rodriges, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes); e Juliana Sayão e Renan Bantim, ambos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Também são autores os pesquisadores chineses Xiaolin Wang, Shunxing Jiang, Xin Cheng, Qiang Wang, He Chen, Ning Li, Jialiang Zhang, Xi Meng, Xinjun Zhang, Rui Qiu e Zhonghe Zhou – todos do IVPP –; e Yingxia Ma e Yahefujiang Paidoula, do Museu de Hami.
Assessoria de Comunicação FAPERJ