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As ações implementadas na Amazônia brasileira pelo governo federal entre os anos de 2003 e 2010 foram responsáveis por um expressivo ganho de qualidade na governança socioambiental na região, o que redundou em uma significativa redução do desmatamento. A afirmação resulta de análises feitas durante a pesquisa de doutorado de João Paulo Ribeiro Capobianco, desenvolvida no Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE/USP) sob orientação do físico José Goldemberg, ministro do Meio Ambiente em 1992 e que, atualmente, é presidente da FAPESP.
A pesquisa buscou identificar e descrever o marco conceitual e os fundamentos que orientaram as ações governamentais, assim como seus diferenciais em relação ao desenvolvido desde a década de 1960, quando a Amazônia passou a ser objeto de ações planejadas por parte do governo federal. A partir disso, foi feito um comparativo com ações na região realizadas em gestões anteriores, especificamente na década de 1990.

O objeto da análise foi o conjunto de políticas públicas, planos e ações elaborados entre os anos de 2003 e 2010, com avaliação específica e detalhada de ações em três frentes, compostas pelo Programa Amazônia Sustentável (PAS), desenvolvido para promover o desenvolvimento sustentável na macrorregião amazônica, pelo Plano BR163 Sustentável, voltado ao desenvolvimento local de regiões ameaçadas pela expansão da chamada fronteira predatória, e o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), para intervenções imediatas e reversão de índices de desmatamento em curso.

Com base em dados públicos oficiais, Capobianco analisou ainda eventuais efeitos de políticas públicas implementadas nesse período sobre os vetores socioeconômicos, incluindo a exploração e o uso de recursos naturais na Amazônia, a fim de discutir os efeitos duradouros dessas políticas na região.

“Durante a pesquisa foram verificados os efeitos das ações de controle do desmatamento entre 2003 e 2010 e analisados comparativamente a evolução da área plantada de soja e do rebanho bovino, o preço das commodities e o desmatamento, incluindo sua dinâmica espacial”, explica o pesquisador.

De acordo com dados usados na pesquisa, à medida que diminuiu o desmatamento, aumentou a área de soja plantada, que não foi afetada pelo aumento do valor do grão no mercado. O mesmo aconteceu com a evolução anual do rebanho bovino na Amazônia Legal, que manteve seu ritmo de crescimento mesmo com a queda no desmatamento.

Para a análise dessas questões, os dados usados na pesquisa foram fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP.

O pesquisador considerou também a evolução do número de autuações por danos à flora emitidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no período de 2000 a 2012 e a evolução do crédito destinado à agricultura e à atividade pecuária na Amazônia legal, entre 1999 e 2012, nos municípios prioritários para a implantação de medidas de controle do desmatamento.

De acordo com Capobianco, algumas premissas foram consideradas essenciais para que fossem alcançados resultados nas três frentes analisadas. “A questão da sustentabilidade na Amazônia passou a ser encarada como um problema de governo, saindo da esfera setorial do Ministério do Meio Ambiente e obtendo o aval direto da presidência da República para a sua articulação, o que garantiu densidade política e poder de convocação interna no aparato de governo”, ele diz.

Para ele, as ações intersetoriais no período, que envolveram tanto os ministérios quanto os órgãos vinculados do governo federal relacionados ao tema, influenciaram direta ou indiretamente a solução do problema por meio do uso de capacidades institucionais. “Foi estabelecido um sistema de avaliação permanente das políticas implementadas, gerando informações periódicas com qualidade e credibilidade, o que contribuiu para consolidar uma comunidade externa de apoio para a definição, implementação e pressão por continuidade das políticas públicas na área”, avalia Capobianco.

Índices sustentáveis

A obtenção de índices considerados promissores na questão do controle do desmatamento na Amazônia, segundo o estudo, resultou da substituição das ações pontuais de controle do desmatamento na Amazônia, iniciadas nos anos 1990, por uma série de políticas governamentais de controle do desmatamento, feitas no período compreendido pela pesquisa.

Os números oficiais mostram que houve um aprimoramento entre as ações de monitoramento, fiscalização e controle ambiental. “O sistema de monitoramento do Inpe passou a controlar o desmatamento em tempo real. Isso foi acompanhado por centenas de operações do Ibama integradas com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e houve ainda um inédito protagonismo da Polícia Federal, que junto com a Polícia Rodoviária Federal e o Exército, além das polícias ambientais nos estados, atenderam a um planejamento estratégico que considerou critérios técnicos e prioridades territoriais”, afirma o pesquisador, que trabalhou também como secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente durante a gestão de Marina Silva (2003-2008).

Para José Goldemberg, a análise revela que a queda no desmatamento na Amazônia só pode ser mantida a partir de políticas públicas consistentes e ações organizadas, em diferentes frentes. “Isso denota uma estratégia complexa adotada pelo governo durante esse período, com ações permanentes que garantiram que a sociedade civil entendesse a importância de diminuir o desmatamento”, conclui.

A análise feita por Capobianco aponta também outros motivos que contribuíram para a queda no desmatamento na Amazônia brasileira durante o período analisado. “Foi feito um ordenamento territorial, com a destinação de cerca de 25 milhões de hectares para unidades de conservação, priorizando zonas de conflitos e de expansão da fronteira agrícola. Também houve a homologação de terras indígenas, a implementação de sistemas de licenciamento e cadastramento ambiental georreferenciado de imóveis rurais, os zoneamentos ecológico-econômicos estaduais e a criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).”

Em sua pesquisa, ele destaca ainda outras ações corresponsáveis pela queda no desmatamento da floresta amazônica, como o combate à grilagem, com o cancelamento de cerca de 66 mil pleitos de títulos de terra que não possuíam origem legal comprovada nos cadastros do Incra, a modificação dos mecanismos e procedimentos para registro de posse e o estímulo à exploração florestal sustentável.

“A regulamentação do sistema de gestão de florestas públicas e do controle de circulação de madeira e a ampliação da área de florestas manejadas certificadas na Amazônia, entre outros motivos, também contribuíram para ampliar o conjunto de fatores que levaram à queda no desmatamento.”

Agência FAPESP