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Um dos mais importantes rios do Brasil, o Doce tem cerca de 850 quilômetros de extensão e banha os estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Sua bacia tem vários afluentes e abrange mais de 200 municípios. Há um ano, o rio sofre consequências do maior desastre ambiental brasileiro. O rompimento de uma barragem em Mariana (MG) jogou mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração no Doce, provocando enormes prejuízos para a população e para o ecossistema da bacia. Até então, o principal problema na bacia eram os desastres provocados por fortes chuvas, tão constantes como graves, com perdas naturais e humanas.
Governador Valadares (MG), em 1979, 1985, 1997, 2005 e 2008, Colatina (ES), em 1997 e em 2013, e Ponte Nova (MG), em 2008, foram cidades que enfrentaram desastres hidrológicos de sérias proporções. Transbordamentos menos intensos são muito mais comuns. A frequência de casos levou à instalação de um sistema de alertas contra cheias em 1997 sob responsabilidade da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM).

“O sistema de alerta atualmente operacional no rio Doce realiza previsões hidrológicas de vazões por meio de um modelo linear de propagação, que utiliza a leitura de vazão de uma estação a montante de outra seção para prever a vazão esperada em sete das cidades mais importantes da bacia com antecedência de até 24 horas”, disse Javier Tomasella, pesquisador do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).

Mas 24 horas muitas vezes não é o suficiente. “Isso pode ser inadequado em muitos dos municípios da região, como é o caso de bacias de cabeceiras do rio Doce com resposta rápida do aumento de vazão, que geralmente aparecem associadas aos desastres naturais com maior impacto em perdas de vida humana”, disse Tomasella na FAPESP Week Montevideo, realizada dias 17 e 18 de novembro de 2016 na capital uruguaia. O evento foi organizado pela FAPESP em colaboração com a Asociación de Universidades Grupo Montevideo (AUGM) e a Universidad de la República (UDELAR).

Tão importante quanto um sistema de alerta é a implantação de um sistema de previsão. A ideia é que ambos trabalhem em conjunto, de modo a prever com relativa antecedência o nível de aumento de um rio e poder avisar as populações ribeirinhas para que desocupem as áreas com maior risco de inundação.

Um sistema de previsão e alerta contra enchentes reúne uma série de atividades que exige a colaboração de diversos profissionais, como meteorologistas, hidrólogos e gestores de desastres.

Tomasella apresentou no simpósio uma avaliação de um sistema de previsão de vazões, desenvolvido em uma parceria entre o Cemaden e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). As previsões são realizadas utilizando o Modelo Hidrológico Distribuído (MHD) do Inpe, com previsões meteorológicas do modelo Eta-CPTEC.

“Nossas estatísticas de desempenhos indicam que o MHD-Inpe mostra resultados promissores para antecedência de até cinco dias. A análise indica que o desempenho depende da escala da bacia e que os resultados são extremamente dependentes da inicialização do modelo hidrológico, o que torna essencial a operação em conjunto com um sistema de monitoramento em tempo real”, disse Tomasella.

Um modelo hidrológico é uma representação simplificada do ciclo hidrológico no qual equações matemáticas representam os diferentes processos que compõem o ciclo.

Previsão por conjunto

Processos hidrológicos são complexos e muitas vezes não totalmente conhecidos. Por conta disso, a representação matemática apresenta limitações. Os modelos podem diferir com relação à estrutura. Os pesquisadores destacam que a escolha de um modelo deve ser baseada nas características da área de estudo e na finalidade da modelagem. A escolha do detalhamento da simulação depende das informações básicas disponíveis.

Tomasella explica que o MHD-Inpe foi desenvolvido para interagir com modelos atmosféricos em estudos sobre mudanças ambientais globais. No MHD-Inpe, a bacia a ser representada é dividida em uma grade de células regulares, para facilitar a troca de informações entre modelos. O tamanho da célula pode variar de acordo com a região onde está sendo aplicado e da densidade de informações disponíveis.

O MHD-Inpe está subdividido em módulos de resolução como “balanço de água no solo”, “evaporação de superfície de água livre, áreas saturadas, interceptação e transpiração da vegetação” e “escoamentos superficial, subsuperficial e subterrâneo em cada célula”.

Tomasella explica que o MHD-Inpe representa o ciclo hidrológico diário e horário do rio e permite fazer previsões por conjunto de vazão horária por meio de diferentes partes do modelo atmosférico Eta-CPTEC, utilizado no Brasil e em vários outros países para previsões de tempo, clima e mudanças climáticas, que fornece previsões por conjunto e com alta resolução que alimentam o modelo hidrológico.

“A atmosfera é um sistema dinâmico complexo e não linear e predizer seu estado em um tempo futuro carrega incertezas inerentes aos modelos e às limitações do conhecimento. Por conta disso, a previsão de tempo emprega uma técnica denominada Previsão por Conjunto, para estimar prováveis estados futuros da atmosfera”, disse à Agência FAPESP.

“Como a atmosfera é um sistema caótico, pequenas incertezas no seu estado inicial podem acarretar enormes variações em uma previsão. Com o intuito de minimizar esses erros, os modelos numéricos de previsão são executados um número de vezes com pequenas perturbações nas condições iniciais, gerando um conjunto de previsões, denominados membros. O conjunto completo das previsões geradas nesses processos é referenciado como previsão de tempo por conjunto. Assim, a previsão de tempo por conjunto é considerada como entrada no modelo hidrológico que assim produz as predições probabilísticas da descarga dos rios”, disse.

Segundo pesquisadores do Cemaden e do Inpe, nos estudos realizados até o momento, os resultados atingidos com o uso do MHD-Inpe indicam que o modelo tem capacidade para ser utilizado como ferramenta para a previsão e alerta de desastres hidrológicos. O Cemaden já monitora 26 dos municípios da bacia do rio Doce.

Saiba mais sobre a FAPESP Week Montevideo: www.fapesp.br/week2016/montevideo.

Agência FAPESP