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Em um estudo publicado esta semana na revista PLoS One, pesquisadores brasileiros descrevem a identificação de 13 lipídeos encontrados no organismo de mosquitos do gênero Aedes que podem servir de biomarcadores da infecção pelo vírus Zika. O trabalho foi conduzido com apoio da FAPESP no âmbito da Rede de Pesquisa sobre Zika Vírus em São Paulo (Rede Zika).
Segundo os autores, a descoberta abre caminho para o desenvolvimento de estratégias voltadas a bloquear a infecção no inseto vetor – interrompendo assim a transmissão para humanos.

“Essas moléculas, importantes para que o vírus consiga entrar nas células e se replicar, são potenciais alvos terapêuticos, pois estudos anteriores mostraram que há moléculas que participam da infecção viral em mosquitos e que também são encontradas em humanos”, afirmou Rodrigo Ramos Catharino, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual de Campinas (FCF-Unicamp) e coordenador do Laboratório Innovare de Biomarcadores.

A maior parte do trabalho foi feita durante o mestrado de Carlos Fernando Melo, sob a orientação de Catharino e com colaboração de Jayme Souza-Neto, pesquisador da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Botucatu. Também participaram os pesquisadores José Luiz Proença Modena e Clarice Weis Arns, do Instituto de Biologia da Unicamp. Todos os pesquisadores integram a Rede Zika.

O grupo infectou uma linhagem celular extraída de larvas do mosquito Aedes albopictus – parente do Aedes aegypti e também transmissor de arboviroses – com a cepa brasileira do vírus Zika isolada por pesquisadores do Instituto Evandro Chagas em um paciente do Ceará. Os resultados foram comparados com os de uma cultura não infectada, que serviu como grupo controle.

“Já se sabia que, quando o vírus da dengue infecta as células do mosquito vetor, um conjunto de lipídeos tem a expressão aumentada. Decidimos investigar se isso também acontecia no caso do Zika”, contou Melo.

As células foram cultivadas sobre uma lamínula de vidro, uma espécie de película que permite o transporte do material para ser posteriormente analisado em equipamentos – no caso, o espectrômetro de massas.

Cerca de cinco dias após a inoculação do Zika em uma das culturas já era possível notar pelo microscópio alterações morfológicas que confirmavam o avanço da infecção.

“As células da linhagem infectada haviam se aglutinado, formando aglomerados, enquanto a linhagem controle se assemelhava a um tapete uniforme. Só então tivemos certeza de que o vírus havia infectado as células e demos início à análise do perfil lipídico”, explicou Melo.

Com auxílio de técnicas de espectrometria de massas, os pesquisadores identificaram todos os lipídeos expressos nas duas linhagens do estudo. Por meio de análise estatística e análise de imagem, foi possível identificar o conjunto de 13 lipídeos cuja expressão chegou a dobrar na cultura infectada (veja tabela abaixo).

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“Algumas dessas moléculas ajudam o vírus a entrar nas células, como é o caso das classes fosfatidilserina (phosphatidylserine - PS) e fosfatidiletanolamina (phosphatidylethanolamine - PE). Já as da classe fosfatidilcolina (phosphatidylcholine – PC) auxiliam diretamente na replicação viral, pois fazem parte do vacúolo que se forma no interior da célula para que o patógeno se reproduza. Se encontrarmos meios para bloquear esses lipídeos, conseguiremos, em tese, impedir o avanço da infecção”, contou Melo.

Além disso, foi identificada a molécula esfingofungina F – supostamente relacionada com uma resposta imune celular contra o patógeno. “Estudos anteriores sugerem que esse lipídeo teria a função de bloquear a replicação viral no interior celular. Nesse caso, portanto, seriam interessantes estratégias para aumentar sua concentração nas células infectadas”, comentou Melo.

Para o pesquisador, o novo conhecimento abre diversas possibilidades de intervenção. Um exemplo seria investir em abordagens ambientais, ou seja, fazer com que o mosquito entre em contato com moléculas de esfingofungina F exógenas, como se faz hoje com inseticidas.

Outra estratégia seria desenvolver um mosquito transgênico, no qual a expressão de alguns desses lipídeos seria suprimida ou aumentada – dependendo do caso.

Próximos passos

De acordo com Catharino, durante o doutorado de Melo, mosquitos do gênero Aedes serão inoculados com o Zika em laboratório com o intuito de descobrir se in vivo o mesmo grupo de lipídeos é alterado pela infecção.

“Também vamos trabalhar estratégias para o diagnóstico do Zika. Já temos um método praticamente pronto, que usa espectrometria de massas para identificar metabólitos presentes no sangue ou na urina. Pretendemos tornar esse teste mais abrangente, capaz de identificar outras arboviroses. Além disso, serão feitos diversos estudos de metabolômica em pacientes com Zika”, contou Catharino.

O trabalho recém-divulgado contou com apoio da FAPESP por meio de um Projeto Temático, coordenado por Aníbal Eugênio Vercesi, professor da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, além de um Auxílio à Pesquisa - Regular coordenado por Catharino, de um Auxílio Jovem Pesquisador coordenado por Souza-Neto e das bolsas de doutorado de Cibele Zanardi Esteves e Diogo Noin de Oliveira – todos coautores do artigo publicado na PLoS One.

O artigo A Lipidomics Approach in the Characterization of Zika-Infected Mosquito Cells: Potential Targets for Breaking the Transmission Cycle (doi: 10.1371/journal.pone.0164377) pode ser lido em journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0164377.

Agência FAPESP