Com base em modelos científicos, ilustrou o que pode acontecer até o fim deste século em locais como Amsterdã (Holanda), Dubai (Emirados Árabes Unidos), Flórida (Estados Unidos), Xangai (China), Lagos (Nigéria) e Rio de Janeiro (Brasil) – caso as emissões de CO2 se mantenham nos níveis atuais.
Na sequência, apresentou uma possível solução para o problema por meio do plantio de árvores, que ajudariam a sequestrar parte do carbono emitido e fixá-lo na terra. Daí surgiu a proposta de que cada atleta plantasse – durante a cerimônia – uma semente e que, posteriormente, as 11 mil mudas sejam transferidas para o Parque Radical, estrutura construída para os jogos no Complexo Esportivo de Deodoro, para formar a Floresta dos Atletas. As espécies de plantas foram distribuídas de acordo com a nacionalidade dos competidores.
O roteiro foi idealizado e dirigido pelo cineasta Fernando Meirelles e sua produção contou com a consultoria dos pesquisadores Tasso Azevedo e Paulo Artaxo.
Azevedo, engenheiro florestal, coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima (SEEG) e diretor executivo do Imaflora, tratou do tema “floresta”. Artaxo, que é professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) e da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), ficou responsável pelas questões referentes às mudanças climáticas.
Artaxo comentou, em entrevista à Agência FAPESP, qual foi sua participação na cerimônia de abertura da Olimpíada e como isso pode contribuir para a causa ambiental.
Agência FAPESP – De quem foi a ideia de abordar o tema das mudanças climáticas globais na cerimônia de abertura e qual foi sua contribuição?
Paulo Artaxo – O Fernando Meirelles é um cineasta bastante sensível às questões ambientais e teve a ideia de incluir o tema das mudanças climáticas na cerimônia de abertura. A equipe dele me procurou para que não houvesse nenhum deslize científico na mensagem que seria transmitida no filme final. Minha tarefa foi separar produtos científicos confiáveis, como gráficos e animações. Fui atrás das melhores e mais atuais referências, como os mapas de elevação do nível do mar produzidos pelo United States Geological Survey e pelo International Geosphere-Biosphere Programme (IGBP). Principalmente em relação ao aumento do nível do mar, há alguns sites que exageram no problema e sugerem que o planeta inteiro vai ficar embaixo d’água, mas não é o que vai acontecer. São necessárias fontes e modelos confiáveis e isso não é algo trivial. Houve a preocupação de abordar a questão de maneira leve, afinal era uma festa de abertura, mas, ao mesmo tempo, passar a mensagem de que temos de cuidar do nosso planeta. Logo após a sessão dedicada à mudança climática veio o tema das florestas, que contou com a consultoria de Tasso Azevedo.
Agência FAPESP – Como o senhor avalia o resultado do trabalho e seu impacto?
Artaxo – A ideia era contar uma história e, assim, tratar das principais questões relacionadas às mudanças climáticas: aumento da temperatura do planeta, sua relação com as emissões de CO2 e de aerossóis resultantes das atividades humanas e, por último o aumento do nível do mar. O resultado final deu muito certo e ajudou a mostrar que o Brasil não se resume a samba, carnaval e Gisele Bündchen, mas também está envolvido nas questões científicas globais. Penso que tão importante quanto produzir ciência de qualidade é trabalhar para a disseminação desse conhecimento para toda a sociedade – não apenas para a comunidade acadêmica e os formuladores de políticas públicas, como a Organização das Nações Unidas ou o IPCC. Acredito que a mensagem, durante a cerimônia de abertura, foi passada de modo que mesmo as pessoas sem qualquer formação científica puderam compreender e isso é extremamente importante.
Agência FAPESP – De que forma isso pode ajudar a combater o problema climático?
Artaxo – Desde o terceiro relatório do IPCC, divulgado há cerca de 15 anos, tem sido falado claramente que se não houver uma redução na emissões de gases-estufa haverá um aumento na temperatura do planeta. Foi somente depois de 2007, quando o IPCC ganhou o Nobel da Paz, que o tema das mudanças climáticas ganhou credibilidade. Agora, o Acordo de Paris deixou claro que a humanidade vai atuar nessa questão para minimizar os impactos. Se o fará na velocidade necessária e da forma necessária, ninguém sabe. O fato é que os políticos, em geral, respondem às demandas da população que os elege. Mas há interesses econômico e políticos envolvidos. E o setor de exploração de petróleo e carvão ainda é o maior setor econômico do planeta e não jogará a galinha dos ovos de ouro fora da noite para o dia. É preciso haver muita pressão por parte da sociedade, muita política pública e ação governamental. Isso está ocorrendo na China, na Europa e nos Estados Unidos. Cada país adotou a sua meta nacional de redução de emissão de carbono, o que é absolutamente estratégico para o planeta. Claro que os compromissos feitos até o momento não são suficientes para garantir clima estável ao longo das próximas décadas, mas esperamos que isso mude conforme aumentam as evidências de que os impactos podem ser muito importantes, inclusive economicamente. É um jogo entre a sociedade, a economia que move o planeta e os tomadores de decisão. Temos de atuar em todos os níveis e o filme da Rio 2016 ajudou a passar informação para a população em geral. Deixou uma mensagem inequívoca de que é preciso agir para frear as mudanças climáticas globais.
Clique nas imagens para abrir as animações. Os gifs foram feitos pelo climatologista britânico Ed Hawkins, da Universidade de Reading, no Reino Unido.
Agência FAPESP