Agora, o mesmo grupo publicou nesta quinta-feira (04/08), na revista Science, os resultados da etapa seguinte, a última antes de começarem os testes em seres humanos.
“Esses resultados são importantes porque mostram que é possível gerar proteção contra o Zika em macacos, animais com o sistema de defesa muito mais semelhante ao do ser humano do que os camundongos”, afirma o imunologista brasileiro Rafael Larocca, pesquisador do Centro de Virologia e Pesquisa em Vacina (CVVR) da Escola Médica Harvard, nos Estados Unidos. Larocca integra a equipe de Dan Barouch no CVVR e, ao lado do colega Peter Abbink, é um dos principais autores dos dois estudos.
Nos testes mais recentes, os pesquisadores vacinaram macacos rhesus – com dose única ou uma dose inicial seguida de reforço – usando uma destas três formulações: a de vírus inativado, a vacina de DNA ou uma terceira possibilidade, uma formulação que usa adenovírus recombinante para expressar os genes do Zika. Todas elas se mostraram igualmente capazes de impedir a infecção posterior pela variedade do Zika em circulação no Brasil e em Porto Rico.
Uma dessas formulações em especial – a de vírus inativado, desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Walter Reed, do Exército norte-americano – gerou uma proteção bastante ampla. Macacos e macacas tratados com ela e depois infectados com Zika não apresentaram níveis detectáveis do vírus no sangue, na urina, no líquido cefalorraquidiano e nem na secreção vaginal.
“Esse tipo de proteção é relevante por causa do risco de transmissão sexual”, conta o neuroimunologista Jean Pierre Peron, pesquisador do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e coautor dos artigos.
Até o início do ano só se conhecia a transmissão pela picada de mosquitos, em especial, o Aedes aegypti. Mas relatos apresentados nos últimos meses sugerem que a transmissão sexual, inclusive via sexo oral, pode ter um papel mais importante do que os pesquisadores imaginavam. Vários registros indicavam que o Zika pode ser passado por meio do sêmen – neste mês, uma equipe da França informou que um homem ainda liberava vírus no sêmen 93 dias após a infecção.
Um pouco antes, em julho, pesquisadores norte-americanos haviam relatado o primeiro caso de transmissão sexual de mulher para homem. “Esse quadro é preocupante”, afirma o virologista Paolo Zanotto, que também é pesquisador do ICB-USP e colaborador nos artigos. Ele e Peron participam da Rede Zika, o consórcio de pesquisadores de São Paulo que investigam o vírus com apoio da FAPESP.
Nas últimas semanas Zanotto vem sugerindo ao grupo de Harvard a realização de experimentos em macacos usando diferentes isolados de vírus Zika e de vírus da dengue. “Precisamos verificar se ocorrem interações entre os diferentes vírus e entender as implicações disso”, afirma.
Em um dos experimentos apresentados na Science, os pesquisadores também extraíram anticorpos contra o Zika do sangue de macacos vacinados e os injetaram em camundongos que nunca haviam tido contato com o vírus nem recebido vacina.
Os anticorpos se mostraram potentes o suficiente para proteger os roedores da infecção por Zika. “Essa proteção oferecida por anticorpos transferidos de um organismo para outro demonstra que talvez seja possível desenvolver estratégias de imunização passiva, como a que existe para proteger o feto de mães infectadas por citomegalovírus”, explica Zanotto.
A equipe do CVVR planeja iniciar nos próximos meses os testes com seres humanos, em especial com a formulação contendo o vírus inativado. Ao menos outras duas outras possíveis vacinas de DNA, uma produzida pelos Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID) dos Estados Unidos e outra pelas empresas GeneOne Life Science e Inovio Pharmaceuticals, já estão recrutando voluntários saudáveis nos Estados Unidos para a primeira das três fases de testes clínicos em seres humanos.
O artigo de Abbink, P. e outros, Protective efficacy of multiple vaccine platforms against Zika virus challenge in rhesus monkeys, pode ser lido em http://science.sciencemag.org/lookup/doi/10.1126/science.aah6157.
Revista Pesquisa FAPESP