Introduzida e aprimorada pelo Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Unifesp no âmbito do projeto temático Combinação de cisplatina e laser no tratamento de câncer de cabeça e pescoço, realizado com o apoio da FAPESP, a técnica consiste na termoablação do tumor – a evaporação da água no compartimento celular de lesões sólidas e consequente eliminação do tecido tumoral – aplicada em paralelo a injeções intratumorais do medicamento quimioterápico cisplatina.
“Com essa prática ambulatorial conseguimos melhorar certas condições mórbidas do paciente, como sangramento, dor por compressão tumoral, infecção local e odor, que impactam a qualidade de vida em uma doença avançada”, diz Marcos Bandiera Paiva, que trouxe a técnica para o Brasil após 20 anos de pesquisa na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), onde mais de 500 pacientes já foram submetidos ao procedimento com sucesso.
Conhecida como laser-indução de terapia térmica (LITT), a técnica é utilizada na UCLA para termoablação de tumores de cérebro, mama, pulmão e próstata. Com o apoio da FAPESP, o tratamento foi aprimorado por meio da aplicação de injeções locais de quimioterapia, utilizando-se o quimioterápico cisplatina em combinação com a LITT, uma inovação em comparação ao tratamento administrado nos pacientes nos Estados Unidos, feito apenas com o laser.
A vantagem da combinação de cisplatina com LITT está na abrangência do procedimento. Durante a desobstrução tumoral, observam-se níveis máximos de energia na área central do tumor, submetida a temperaturas acima de 100° C, ao passo que as margens são tratadas em níveis subterapêuticos, com a temperatura do laser entre 40°C e 60°C, o que propicia a recidiva do crescimento tumoral. As injeções localizadas de cisplatina na periferia do tumor potencializam a erradicação tumoral localizada – isso porque, explica Paiva, aquecida nas regiões periféricas do tumor durante a aplicação do laser, a cisplatina tem sua toxicidade aumentada.
“O calor faz com que o quimioterápico tenha sua capacidade de penetrar nas membranas celulares exacerbadas. A célula tumoral fica mais facilmente permeável à cisplatina, potencializando assim a toxicidade da quimioterapia local e levando a uma erradicação mais eficaz do tumor.”
Ao contrário da radioterapia, cuja radiação possui energia suficiente para ionizar átomos e moléculas, danificando as células saudáveis e afetando o material genético, o procedimento adotado no ambulatório da Unifesp pode ser repetido após um intervalo de três semanas, garantindo melhores resultados e até a remoção completa do tumor.
Atendimento
Os pacientes atendidos passam por uma triagem antes de serem submetidos ao tratamento. Entre os elegíveis estão aqueles que não respondem a terapias convencionais, como quimioterapia sistêmica ou radioterapia, e que não podem ser submetidos a cirurgia. É preciso estar em condições clínicas adequadas à administração de anestesia geral.
“A técnica introduz o conceito inovador de um procedimento minimamente invasivo por meio de injeções intratumorais de altas doses de quimioterapia combinada com hipertermia local. Trata-se de um tratamento experimental paliativo para controle local da doença em alguns pacientes selecionados, não havendo garantias de cura, mas considerável melhora de alguns sintomas específicos”, diz Paiva.
De acordo com o pesquisador, “o tratamento traz ainda alguma esperança aos pacientes para que a técnica, localizada, possa ser associada a tratamentos sistêmicos inovadores em cabeça e pescoço, como a administração de Cetuximab”.
Aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2010, o Cetuximab é um anticorpo monoclonal, que age de forma mais direcionada – no caso, tendo como alvo o receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFR), inibindo sua ativação e a consequente transmissão de sinal, o que resulta na redução da invasão dos tecidos normais pelas células malignas e da disseminação de tumores em novas áreas. O medicamento também inibe a capacidade de células malignas repararem o dano causado por quimioterapia ou radioterapia.
Os pesquisadores seguem buscando aprimorar a técnica de laser-indução de terapia térmica no ambulatório, inclusive para aplicação em tratamentos de outras doenças.
“Já demonstramos que o tratamento nas margens tumorais em pacientes com câncer avançado de cabeça e pescoço combinado com injeções locais de cisplatina e seguido de termoablação tumoral por LITT não é tóxico, melhora a qualidade de vida dos pacientes e é eficaz. A técnica pode ser aprimorada e beneficiar ainda mais pessoas. Por meio de uma fibra óptica conectada ao laser, por exemplo, poderemos ter acesso cirúrgico a qualquer lesão no corpo humano e, assim, aplicar um procedimento ambulatorial minimamente invasivo que diminui os custos no Sistema Único de Saúde (SUS)”, diz Paiva.
Agência FAPESP