Considera-se que uma maneira de tornar o sistema de saúde mais eficiente é desenvolver softwares para diagnóstico auxiliado por computador, inclusive para oferecer serviços de saúde personalizados, o que por sua vez requer a adoção de prontuários médicos eletrônicos.
Nanotecnologia, Big Data e convergência de tecnologias
No artigo "On the convergence of nanotechnology and Big Data analysis for computer-aided diagnosis", publicado este ano na revista científica Nanomedicine, os Profs. Drs. Osvaldo Novais de Oliveira Junior (Instituto de Física de São Carlos - IFSC/USP), Fernando Vieira Paulovich (Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação - ICMC/USP), José Fernando Rodrigues Junior (ICMC/USP) e Maria Cristina Ferreira de Oliveira (ICMC/USP) descrevem três pilares que entendem ser fundamentais para aprimorar o sistema de saúde, tanto no Brasil como em outros países.
O primeiro deles se refere à nanotecnologia, área em que se estudam substâncias e materiais em nível atômico e molecular, pois nanomateriais são essenciais para produzir os sensores e biossensores de interesse para a comunidade médica. A nanotecnologia já contribui para a medicina com dispositivos eletrônicos para diagnóstico de doenças, como diabetes, dengue, hipertensão arterial, câncer, entre outras patologias. Conceitos e métodos de Big Data formam o segundo pilar, em que se destaca a necessidade de usar métodos computacionais para armazenar e analisar grandes volumes de dados de natureza diversa. Já o terceiro pilar é calcado nos métodos que permitam integrar diversas ferramentas e técnicas computacionais (como o aprendizado de máquina*), de modo que a grande quantidade de informação produzida ou capturada se transforme em conhecimento.
No arcabouço descrito no artigo em questão, um dos objetivos é permitir que dados clínicos de pacientes sejam armazenados em nuvem, de forma a serem compartilhados com outros médicos, podendo facilitar futuras consultas. Se a citada convergência de tecnologias e esse tipo de armazenamento de dados se tornarem reais, a Maria Cristina Oliveira prevê maior quantidade de diagnósticos preditivos no futuro: "Com as informações distribuídas e integradas, talvez seja possível obter antecipadamente dados suficientes para tentar entender, por exemplo, onde podem ocorrer novos surtos e epidemias".
Essa integração de informações, na perspectiva de José Fernando, será apenas mais uma transformação ocasionada graças ao avanço tecnológico, que substituirá modelos tradicionais de diagnóstico médico. Será algo similar ao que ocorreu com as cartas que perderam espaço para os telefones, que posteriormente foram substituídos pelos e-mails e que antecederam a comunicação através das redes sociais. "Acredito que algo semelhante ocorrerá na medicina, porque o modelo atual utilizado para fazê-la é muito caro e ineficiente, e não se adapta à velocidade das mudanças na sociedade, em virtude das tecnologias disponíveis", comenta José Fernando, acrescentando que o alto custo da medicina é uma motivação para que aconteçam mudanças significativas na área.
Para os autores, a racionalização de recursos com a melhora na qualidade de diagnóstico requer uniformização de dados de pacientes. José Fernando explica que não há, por exemplo, um método padrão para que médicos registrem informações referentes aos pacientes. E essa liberdade, segundo o docente, é prejudicial para a integração de dados. "Têm surgido padrões que levarão esses especialistas a descrever um determinado tratamento de forma mais sistemática, normalizada e padronizada".
A substituição de médicos por máquinas, para algumas tarefas em diagnóstico, pode representar uma quebra de paradigma. "Obviamente, há casos mais complexos na medicina, nos quais talvez nunca seja possível substituir um especialista por um equipamento", comenta Fernando Paulovich, acrescentando que, hoje, as buscas na internet - em sistemas com dados confiáveis - já podem fornecer informações semelhantes àquelas que se obtém na avaliação de um médico. Além disso, Paulovich enfatiza que alguns procedimentos, como ir a um consultório simplesmente para buscar um resultado de exame, já deveriam ser substituídos, uma vez que os dados dos exames podem ser obtidos online ou via e-mail.
Desafios para construir esse futuro
Para os quatro pesquisadores, existem grandes desafios no sentido de desenvolver um sistema de integração capaz de analisar dados de um paciente, obtidos via Big Data, e de transformar essas informações em conhecimento. Para a Maria Cristina Oliveira, os obstáculos a serem enfrentados não são apenas científicos, mas também políticos e sociais. "Acho que os desafios maiores não são exatamente os técnicos, mas sim aqueles em que você precisa fazer com que as pessoas aceitem mudanças e cheguem em um consenso para viabilizar o uso desse tipo de sistema de integração de tecnologias e dados".
Para Osvaldo Novais de Oliveira Junior, a medicina já tem passado por transformações ao longo dos últimos anos. Atualmente, médicos têm suporte tecnológico que não existia há trinta ou quarenta anos. "Hoje a atuação de um profissional da saúde é muito diferente, porque em geral ele não emite uma opinião antes de analisar resultados de exames. Então, de certa forma, essa mudança já está ocorrendo", diz o docente do IFSC, complementando que essa possível futura transformação exigirá que os profissionais da área médica aprendam a lidar cada vez mais com novas tecnologias.
No que concerne a outras ações dos autores do artigo e de seus grupos de pesquisa, José Fernando já mantém colaboração com o Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (InCor/HC/FM/USP), a fim de analisar as dificuldades dos especialistas do InCor no armazenamento e processamento de dados de pacientes. Osvaldo, Fernando e Maria Cristina têm atuado conjuntamente em técnicas de visualização de informação para melhorar o desempenho de biossensores para análises clínicas de doenças tropicais e câncer - neste último caso, em parceria com o Hospital de Câncer de Barretos.
Além disso, há outras sugestões no artigo publicado na revista Nanomedicine para implementação futura, que talvez possam impactar positivamente os sistemas de saúde nacional e internacional. Um desejo dos entrevistados é aproximar grupos de pesquisadores no Brasil que estejam se dedicando aos diversos tópicos – de computação, medicina, física, química, biologia, ciência dos materiais, farmácia –, para ações concertadas que levem ao desenvolvimento de sistemas de diagnóstico assistidos por computador.
Segundo Osvaldo Novais de Oliveira Junior, as propostas apresentadas no artigo podem abrir caminhos para pesquisas que não tenham relação só com a medicina. Os mesmos conceitos preconizados no artigo podem ser usados para desenvolver sistemas aplicados na predição de poluição, no monitoramento do uso de armas químicas e biológicas e até de eventuais ataques terroristas.
*O aprendizado de máquina é uma área da computação que aborda o desenvolvimento de técnicas que, baseadas em treinamento, podem exercer determinadas tarefas.
Assessoria de Comunicação - IFSC/USP