A investigação foi conduzida por um grupo de pesquisadores brasileiros, canadenses e norte-americanos que integram a campanha científica Green Ocean Amazon (GOAmazon), que conta com apoio da FAPESP, do Departamento de Energia dos Estados Unidos (DoE, na sigla em inglês), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), entre outros parceiros.
De acordo com Artaxo, o estudo tinha como objetivo determinar a natureza das partículas em suspensão – verificar se são predominantemente líquidas ou sólidas – porque isso influencia a dinâmica dos processos atmosféricos que ocorrem na Amazônia.
“As reações químicas de troca de gases entre a atmosfera e a floresta são muito mais rápidas, fortes e intensas quando as partículas são líquidas. O retorno para o ecossistema dos nutrientes críticos para o ciclo biogeoquímico das plantas ocorre de forma mais acelerada quando eles estão na forma solúvel”, explicou o pesquisador.
Os resultados mostraram que, em condições naturais, quase 100% das partículas atmosféricas estão em estado líquido quando a umidade relativa do ar está acima de 80%. Isso ajuda a explicar, por exemplo, porque o ciclo hidrológico na Amazônia é tão intenso.
“As partículas líquidas funcionam de forma muito eficiente como núcleo de condensação de nuvens. As gotas aumentam de tamanho rapidamente e logo adquirem massa suficiente para precipitar”, contou Artaxo.
Na presença de poluição, porém, o índice de partículas líquidas na atmosfera cai para 60%, mesmo com alta umidade relativa do ar acima de 80%.
Contando partículas
Para chegar a essas conclusões, foram feitas medições em dois diferentes sítios experimentais que integram o GOAmazon. O primeiro é uma área livre de poluição situada 50 quilômetros ao norte de Manaus, onde se encontra uma das torres de medição do projeto, chamada no estudo de sítio T0z. O segundo, o sítio T3, fica vento abaixo da pluma de Manaus, na cidade de Manacapuru, a 60 km a oeste de Manaus, que frequentemente recebe a pluma de poluição da capital.
Para avaliar as partículas, o grupo usou uma superfície de impactação higroscópica (capaz de absorver água) que funciona como um contador de partículas e foi chamada de impactador. “Nós selecionamos o tamanho da partícula que desejávamos medir, no caso, por exemplo 100 nanômetros, e então contamos o número de partículas antes e depois de elas colidirem com o impactador”, disse Artaxo.
As partículas líquidas são todas depositadas na superfície do impactador, enquanto as sólidas são repelidas e coletadas em uma segunda superfície de medição. “A razão de partículas do primeiro para o segundo impactador é o que chamamos de rebound fraction (fração de ricochete), que foi muito maior em Manacapuru do que no sítio T0z para altas umidades do ar”, afirmou.
Para ter certeza de que a diferença era consequência da poluição e não de outros fatores inerente à cidade de Manacapuru, o grupo fez a mesma comparação medindo as partículas num dia em que as massas de ar que chegavam à região não vinham da cidade de Manaus e sim da região de floresta. Nesse caso, o resultado no T3 foi muito semelhante ao observado no T0z.
“O experimento deixa claro que a natureza das partículas antes e depois da poluição é muito diferente. Quando há poluição, portanto, as plantas não conseguem aproveitar com eficiência os nutrientes presentes na atmosfera, que são perdidos no ecossistema. E isso é muito relevante, pois o fator limitante do crescimento da floresta é a disponibilidade de fósforo, que só é assimilado pela planta na forma solúvel”, comentou Artaxo.
Iniciado em janeiro de 2014, o experimento GoAmazon reúne mais de 100 pesquisadores de diversos países dedicados a estudar o efeito da poluição e das atividades antrópicas em aspectos como química atmosférica, microfísica de nuvens e funcionamento dos ecossistemas. O objetivo final do grupo é estimar o impacto da urbanização em aspectos críticos do ecossistema amazônico, tais como mudanças futuras no balanço radioativo, na distribuição de energia, no clima regional, nas nuvens e seus feedbacks para o clima global (leia mais em: agencia.fapesp.br/18691/)
O artigo Sub-micrometre particulate matter is primarily in liquid form over Amazon rainforest (doi: 10.1038/ngeo2599), pode ser lido em www.nature.com/ngeo/journal/vaop/ncurrent/full/ngeo2599.html.
Agência FAPESP