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Entre os aceleradores de partículas em construção no mundo, apenas o Sirius, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas (SP), e o Max IV, na Suécia, terão resolução capaz de identificar estruturas de células complexas como as de mamíferos, entre outras possibilidades de pesquisa em diversos campos.
Essa e outras similaridades das iniciativas brasileira e sueca em geração de luz síncrotron de quarta geração, pioneiras no mundo, foram destacadas como importantes potenciais de colaboração entre as comunidades científicas dos dois países durante o Brazil-Sweden Workshop on Frontier of Science and Education, realizado na FAPESP no dia 16 de outubro.

O evento, promovido pela FAPESP e as universidades suecas Uppsala University e Lund University, teve o objetivo de ampliar a colaboração científica entre a Suécia e o Estado de São Paulo promovendo o intercâmbio de pesquisas, tecnologias e experiências. Ambas já possuem acordos de cooperação com a FAPESP (leia mais em fapesp.br/9568 e fapesp.br/9780).

“Estamos falando de duas comunidades acadêmicas que já possuem importantes colaborações, mas cujos potenciais ainda podem ser mais bem explorados, especialmente diante das possibilidades de pesquisa surgidas com o desenvolvimento das novas fontes de radiação síncrotron do Brasil e da Suécia”, disse Leif Kirsebom, da Uppsala University.

Entre essas possibilidades está a citada tomografia de células de mamíferos. A atual fonte de luz síncrotron brasileira, a única da América Latina, já permite a análise de amostras em 3D por tomografia de raios X com resolução micrométrica, usada na análise de amostras milimétricas em materiais orgânicos e inorgânicos. Na linha de luz dedicada à técnica é possível observar as microestruturas internas de materiais moles, de baixa densidade ou baseados em elementos químicos leves, além de observações superficiais de materiais densos, resistentes ou pesados.

“Os síncrotrons de terceira geração, os mais modernos em operação hoje em dia, possibilitaram uma revolução na área de imagens e tomografia devido à coerência do feixe, o que permite técnicas de imagens mais precisas, como tomografias de células individuais, a exemplo do que se faz em partes do corpo humano, mas chegando a uma escala de identificação das estruturas subcelulares. Como os feixes de terceira geração têm uma limitação de tamanho, não é possível fazer técnicas em células maiores, como as de mamíferos”, explicou Antonio José Roque da Silva, diretor do LNLS.

Sirius e Max IV serão as primeiras máquinas que permitiriam esse tipo de estudo, acompanhando processos que são importantes não só para tratamento de doenças, mas para várias outras questões ligadas à saúde e à biologia. “Trabalhos pioneiros poderão ser feitos nesses laboratórios, possibilitando o entendimento de uma forma mais profunda da biologia celular”, disse Roque da Silva.

Gunnar Öhrwall, do Max IV Laboratory (MaxLab), destacou o potencial de colaboração entre linhas de pesquisa dos dois aceleradores.

“Ao lado do Max, Sirius vai ser uma das duas facilities líderes no mundo. Tecnologicamente, não haverá grandes diferenças de capacidade entre ambas, mas nós poderemos aprender muito juntos, em campos científicos que cada país domina. É uma competição saudável. Há uma janela de oportunidades extremamente interessante porque o Sirius permitirá ao Brasil estar na liderança em uma série de áreas em que o país já se destaca, como biologia, agricultura, ciências dos materiais, química.”

Para Roque da Silva, um dos diferenciais do Sirius é a interação entre a equipe do acelerador de partículas e a divisão científica do LNLS.

“Nosso síncrotron é parte de um centro [Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM)] que tem laboratórios de biologia, nanotecnologia e nanociência e de bioetanol e energias renováveis, o que permite criar um ambiente de pesquisa que pode gerar um ciclo virtuoso interessante nessas áreas. A máquina está sendo otimizada para permitir que se extraia melhor ciência das linhas de luz, que é o objetivo final, pois o síncrotron não é um acelerador colisor, mas que busca gerar a maior radiação possível para a ciência. Nós queremos ser competitivos em uma faixa de energia importante para a biologia, medicina, agricultura e outras áreas estratégicas para o Brasil, permitindo um salto de qualidade no que é possível fazer no país”, destacou.

Entre as linhas de luz que estarão à disposição da comunidade científica brasileira e internacional no Sirius está a Ipê, acrônico de inelastic photoelectron spectroscopy. Tulio Costa Rizuti da Rocha, também do LNLS, apresentou algumas das possibilidades de pesquisa da linha, que, a exemplo de outras em desenvolvimento, como Cateretê e Imbuia, tem o nome de uma das árvores encontradas na região em que o Sirius está sendo construído.

“Um dos objetivos da Ipê é fazer espectroscopia de raios X moles em baixa energia, mas não em vácuo, como é feito tradicionalmente, permitindo utilizar a técnica em condições ambientais e abrindo uma série de possibilidades de aplicações: no estudo de solos, amostras biológicas, catalisadores e em várias pesquisas que envolvem caracterização de interfaces de superfícies que não são compatíveis com o vácuo”, explicou.

Para isso será utilizado um espectrômetro com uma lente especial. Apenas duas empresas no mundo comercializam o equipamento, que será instalado na linha de luz do Sirius.

João Batista Borges, da Uppsala University, acredita que o Sirius e o Max IV poderão ampliar os resultados de suas pesquisas sobre a síndrome do desconforto respiratório agudo.

“Temos convicção de que as fontes de luz síncrotron de quarta geração ajudarão a elucidar questões-chave dessa fisiopatologia, cuja mortalidade é altíssima, em torno de 40%. Isso porque não se trata de desenvolver novas drogas, mas de regular a máquina que ventila o pulmão do paciente. Para isso é preciso entender em profundidade o problema, na intimidade do pulmão, com o auxílio de imagens com a precisão que só o Sirius e o Max IV fornecerão.”

Borges trabalha na Uppsala University em pesquisas com tomografia por emissão de pósitrons (PET, na sigla em inglês), mapeando se uma unidade pulmonar está inflamada e identificando em que região a inflamação se originou, intuindo qual o mecanismo naquela região que iniciou o processo e testando estratégias protetoras de ventilação mecânica. De acordo com o pesquisador, “a radiação síncrotron de quarta geração possibilitará uma tomografia do pulmão em resoluções espaciais em escala nanométrica, o que uma tomografia convencional não permite”.

O Max IV já está sendo comissionado e deverá ser aberto para usuários no próximo ano. O início das operações do Sirius está previsto para 2018.

O Brazil-Sweden Workshop on Frontier of Science and Education teve ainda apresentações nas áreas de ciências do clima, energia, meio ambiente, física, ciências da vida e áreas afins. Além das universidades de Lund e Uppsala e do LNLS, houve apresentações de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da European Spallation Source (ESS).

Mais informações sobre o workshop: fapesp.br/9803.

Agência FAPESP