O Nobel recompensa seus trabalhos no mapeamento, em nível molecular, dos mecanismos de reparação do DNA, que preservam a informação genética, protegendo as células de processos degenerativos como aqueles associados ao câncer, ao envelhecimento e outros.
Lindahl, do Karolinska Institutet, da Suécia, Modrich, da Stanford University, nos Estados Unidos, e Sancar, da University of Texas, nos Estados Unidos, são três cientistas veteranos, como indicam suas datas de nascimento. E desenvolveram trabalhos pioneiros em uma área de pesquisa que já acumulou mais de cinco décadas de atividade.
Os mais remotos estudos que identificaram algo que repara o DNA datam ainda da década de 1940, sendo que, nos anos 1963 e 1964, foram obtidos os primeiros dados de mecanismos de reparo de DNA em bactérias.
O estudo de Lindahl foi desenvolvido no início dos anos 1970. Antes de sua pesquisa, pensava-se que o DNA fosse uma estrutura extremamente estável. Mas ele mostrou que a realidade é bem outra. E que a taxa de decaimento, natural por simples reação com a molécula de água, dessa macromolécula é mesmo tão alta que, se não houvesse algum sistema de reparação, o desenvolvimento da vida na Terra seria literalmente impossível.
Sancar mapeou o mecanismo de reparo do DNA em relação aos danos causados pela radiação ultravioleta ou por substancias mutagênicas. E Modrich estudou o mecanismo de correção de erros no processo de replicação do DNA durante a divisão celular.
“Há muitos mecanismos de reparação. Penso que, ao premiar pesquisadores que estudaram três mecanismos diferentes, a Academia Sueca procurou contemplar a área como um todo”, disse à Agência FAPESP o pesquisador Carlos Frederico Menck, professor titular do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo. Menck é especializado em reparo de DNA e coordenador do projeto temático “Consequências de deficiências de reparo de lesões no genoma”, apoiado pela FAPESP.
“De fato, não houve na área nenhuma descoberta que fosse sozinha revolucionária. Houve, isto sim, várias descobertas complementares, que compuseram um campo de pesquisa extremamente importante”, afirmou o pesquisador.
O estatuto da premiação dispõe que um único prêmio não pode ser compartilhado por mais de três pessoas. Menck acredita que, se não valesse tal regra, o prêmio deste ano poderia ter sido estendido a pelo menos mais três pesquisadores: o norte-americano Philip Hanawalt, o croata Miroslav Radman e a norte-americana Evelyn Witkin.
Os mecanismos de reparo são cruciais para a manutenção e a evolução da vida, porque protegem o DNA contra lesões de toda ordem, preservando o genoma. Lesões podem causar mutações capazes de, eventualmente, se transformarem em cânceres. Ou causar a morte de tecidos, acelerando o processo de envelhecimento. Essas lesões vão desde aquelas provocadas por fatores externos, como a radiação ultravioleta, os radicais livres ou outras substâncias carcinogênicas, até processos endógenos, como erros de cópia durante a divisão celular. Inclusive radicais de oxigênio gerados no próprio metabolismo celular durante a respiração são capazes de lesar o genoma.
“Os próprios quimioterápicos utilizados no tratamento do câncer, em sua maioria, funcionam lesando o DNA. Como as células cancerosas replicam-se muito mais do que as células sadias, elas se tornam bem mais suscetíveis à lesão provocada pelo fármaco”, informou Menck. “E, por esse motivo, o estudo de processos de reparo de DNA lesado pelos quimioterápicos poderá nos ajudar a combater mais eficazmente o câncer.”
Pesquisas avançadas envolvendo os mecanismos de reparo estão em andamento em vários países, inclusive o Brasil, que tem mais de 30 grupos trabalhando direta ou indiretamente na área. “Há vários estudos de reparo de DNA relacionados, por exemplo, com os mecanismos de carcinogênese, processos de envelhecimento e mesmo para o desenvolvimento de terapias mais eficientes contra o câncer”, concluiu o pesquisador.
Agência FAPESP