Nutricionista e professora da pós-graduação em Nutrição da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), ela vem investigando os mecanismos bioquímicos do cálcio no interior das células do tecido adiposo e os efeitos dele como um aliado natural no tratamento contra a obesidade.
Não por mera coincidência, a pesquisa ocorre no momento em que a obesidade tornou-se um dos maiores problemas de saúde pública, sendo considerada uma epidemia em todo o mundo. “No Brasil, assim como em outros países, também houve um aumento exponencial dos índices de pessoas obesas e com sobrepeso. Aproximadamente metade da população brasileira está acima do peso, segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde. Daí a importância de estudar esse tema”, justificou Elaine.
No Laboratório de Fisiologia Endócrina do Instituto de Biologia Roberto Alcantara Gomes (Ibrag), na Uerj, ela vem orientando as pesquisas que resultaram nas teses de doutorado das alunas Fernanda Quitete e Jéssica Lopes Nobre, esta última bolsista de Doutorado Nota 10 da FAPERJ. “Resolvemos colocar em prática no laboratório experimentos para testar a hipótese de que o cálcio ajuda a emagrecer. Existem alguns estudos clínicos com pacientes que sugerem o efeito positivo do cálcio nesse sentido, a partir da suplementação dietética de pessoas acima do peso. Mas não se sabe ainda exatamente como são os mecanismos bioquímicos responsáveis por esse papel do cálcio no tratamento da obesidade. Para tentar desvendar esses mecanismos, estamos trabalhando, inicialmente, com testes em ratos”, disse a nutricionista.
Elas analisaram os efeitos da ingestão diária de suplementos de cálcio, misturados à ração de ratos obesos. “Esses roedores ficaram acima do peso na vida adulta após passarem por um desmame precoce na infância, já que a falta de leite materno os ‘programa’ para o desenvolvimento de uma obesidade posterior”, informou. Para fins de comparação, também foi submetido à mesma dieta e recebeu as mesmas doses de cálcio um grupo “controle”, formado por ratos com peso ideal. “Demonstramos que a suplementação dietética com cálcio em ratos acima do peso normalizou a maioria das desordens endócrino-metabólicas observadas na obesidade, como a resistência à insulina, que frequentemente leva ao diabetes, a hiperglicemia e a alta na taxa de triglicerídeos. Esse efeito está relacionado à correção dos níveis de vitamina D no organismo dos ratos”, resumiu Elaine.
Mas o que a concentração de vitamina D no interior do tecido adiposo tem a ver com a obesidade? A vitamina D é essencial para a absorção do cálcio pelo organismo. Como é ela que mantém o metabolismo desse mineral, a chave utilizada na pesquisa para entender a relação entre cálcio e obesidade está nas modificações nessa vitamina. “Nas pessoas obesas, ocorre uma mudança no metabolismo da vitamina D. É comum ocorrer um quadro de escassez da vitamina D no sangue, conhecido como hipovitaminose. Observamos que quanto maior o Índice de Massa Corporal (IMC) dos ratos, ou seja, quanto mais gordos eles estavam, menor eram os níveis de vitamina D no sangue deles. Mas apesar de pouco absorvidas no sangue, as células do tecido adiposo, contraditoriamente, passaram a concentrar até dez vezes mais vitamina D do que as células adiposas de pessoas não obesas. Esse fenômeno ainda tem seus mecanismos bioquímicos pouco compreendidos e é um dos pontos que estamos investigando”, resumiu Elaine.
Para estudar o metabolismo do cálcio no organismo dos ratos, Elaine e equipe isolaram células do tecido adiposo “in vitro”, isto é, colocaram os adipócitos – as "células de gordura” – em tubos de ensaio e incubaram neles moléculas de vitamina D. “De fato, verificamos que a vitamina D regula o processo de adipogênese, que é o processo de formação do tecido adiposo. Os adipócitos passaram a se proliferar bem menos sob a ação da vitamina D”, afirmou.
O acúmulo de vitamina D no tecido adiposo ocorre devido à perda da função da leptina, um hormônio responsável, entre outras coisas, pelo metabolismo dessa vitamina. “Com o aumento de peso e de gordura corporal, ocorre hiperleptinemia e, ao mesmo tempo, resistência a esse hormônio, ou seja, ele perde sua função, deixa de controlar a produção da vitamina D e, consequentemente, a ação desta vitamina sobre a regulação da adipogênese. Sem a ação da leptina no tecido adiposo, ocorre muita produção local de vitamina D, por isso em obesos as concentrações de vitamina D dentro do tecido adiposo chegam a ser 10 vezes aumentadas, apesar de estarem reduzidas no soro. O excesso local de vitamina D leva à resistência de sua ação, da mesma forma que ocorre com a leptina”, explicou. “Como a vitamina D é um composto lipossolúvel, isto é, solúvel em gordura, ela é facilmente armazenada no tecido adiposo. No caso dos obesos, ocorre um sequestro da vitamina D do sangue para o tecido adiposo, que se torna ávido em captar essa vitamina.”
A partir do conjunto dessas evidências, Elaine e equipe concluíram que, na obesidade, ocorre de fato deficiência de vitamina D, e que um leve aumento na ingestão alimentar de cálcio melhora o metabolismo desta vitamina e, consequentemente, as desordens metabólicas associadas à obesidade. “No experimento com os ratos, os obesos emagreceram significativamente ao receber a dieta com cálcio, ao terem a ação da vitamina D normalizada, enquanto os ratos do grupo controle, que não estavam acima do peso, não apresentaram perda de peso, pois já tinham níveis normais de vitamina D”, explicou.
“Pelo resultado que encontramos, é importante prestar atenção à ingestão diária de cálcio e vitamina D, que deve ser adequada. A população em geral se alimenta com pouco cálcio e, quando quer perder peso, se preocupa mais com a quantidade de calorias ingeridas do que em melhorar o perfil metabólico e avaliar os micronutrientes”, recomendou Elaine. Para ela, a pesquisa pode trazer desdobramentos em outras áreas da saúde. “A descoberta dos mecanismos envolvidos na correção da obesidade pelo tratamento com cálcio, além de servir como estratégia para o desenvolvimento de terapia para a obesidade, pode ser importante no controle de outros distúrbios metabólicos. Parece existir uma íntima relação entre o status da vitamina D e as alterações metabólicas em diferentes patologias crônicas, como o câncer”, concluiu. O estudo rendeu publicações em importantes periódicos científicos, como o Journal of Endocrinology e o British Journal of Nutrition.
A equipe envolvida no projeto conta ainda com a participação dos professores da Uerj e Cientistas do Nosso Estado da FAPERJ Egberto Moura e Patricia Lisboa.
Assessoria de Comunicação FAPERJ