Nos casos letais, a expressão estava reduzida quando comparada à expressão dos animais sobreviventes”, disse Andressa de Freitas Mendes Dionisio, autora do estudo e vencedora do prêmio Jovem Investigador no Sepsis 2014: International Symposium, realizado em dezembro, em Paris. O estudo tem apoio da FAPESP na modalidade Bolsa de Pós-Doutorado.
Caso os resultados sejam confirmados por novos estudos, o receptor Ahr, segundo Freitas, poderá se tornar um marcador para auxiliar no diagnóstico e na avaliação do prognóstico de pacientes com sepse.
Além disso, a descoberta abre caminhos para o desenvolvimento de novas drogas contra a principal causa de morte nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e uma das principais causas de mortalidade hospitalar tardia no Brasil.
Também conhecida como infecção generalizada ou septicemia, a doença é caracterizada por uma inflamação sistêmica potencialmente fatal. A resposta inflamatória pode permanecer mesmo após a infecção inicial ter sido debelada e produzir mudanças na temperatura corporal, pressão arterial, frequência cardíaca, contagem de células brancas do sangue e respiração. As formas mais graves de sepse também podem causar disfunção no funcionamento de diversos órgãos, condição conhecida como choque séptico.
Em 2009, durante o doutorado, Freitas observou que nos animais que sucumbem à sepse ocorre falência no processo de migração de neutrófilos – um tipo de célula de defesa – para o foco inicial da infecção.
O estudo também mostrou que uma citocina inflamatória denominada interleucina-17 (IL17) desempenha papel crucial no recrutamento de neutrófilos pelo sistema imune.
“Na época observamos que animais que não expressavam o receptor para IL17 morriam mais de sepse. Trabalhos posteriores, de outros grupos, mostraram que a ativação do receptor Ahr, por sua vez, é importante para desencadear a produção de IL17. Decidimos então investigar como estaria a expressão desse receptor Ahr em um modelo de sepse grave”, contou Freitas.
No laboratório, a sepse foi induzida em camundongos por meio de perfuração no ceco (parte do intestino grosso), o que permitia o extravasamento de fezes e de bactérias intestinais para a cavidade peritoneal. Cerca de seis horas após o procedimento, os roedores já apresentavam sinais clínicos da doença.
“Esse modelo simula quadros de apendicite supurada ou de pacientes que sofrem perfuração no intestino em decorrência de um tiro ou facada”, explicou Freitas.
A gravidade do quadro variava de acordo com o calibre da agulha utilizada no procedimento, sendo que os animais foram divididos em três grupos: sepse letal (100% de mortalidade), sepse subletal (0% de mortalidade) e grupo controle (submetido a cirurgia para abertura da cavidade peritoneal, porém sem perfuração do intestino e, portanto, sem sepse).
Cerca de 18 horas após o quadro instalado, os animais eram sacrificados e, a expressão do receptor Ahr, avaliada em órgãos como pulmão, fígado, baço e em alguns tipos de células de defesa do sangue.
Confirmando a hipótese inicial, os resultados dos testes mostraram que a expressão do receptor Ahr estava aumentada no grupo subletal em relação ao controle.
A elevação foi, em média, de 42% no baço, 212% no pulmão e 983% no fígado. Já no grupo letal, a expressão foi menor quando comparada aos animais que sobreviveram: em média 52% no baço, 62% no pulmão e 51% no fígado.
Opção terapêutica
Em um outro experimento, foi induzido em camundongos um quadro de sepse moderada, com cerca de 40% de mortalidade. Em seguida, os pesquisadores testaram um tratamento com um adjuvante do receptor Ahr denominado FICZ (6-Formylindolo 3,2-bcarbazole).
A substância, capaz de ativar o receptor Ahr, aumentou a sobrevida do grupo tratado para 80%. O resultado, na avaliação de Freitas, abre caminho para uma nova abordagem terapêutica da sepse.
A pesquisa está sendo conduzida no âmbito do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) da FAPESP.
No momento, o grupo tenta desvendar por que a expressão do receptor Ahr está reduzida na sepse grave. Uma das hipóteses é que seja resultado de uma resposta inflamatória muito intensa.
O próximo passo será dosar nos animais, tanto no modelo de sepse letal como subletal, a produção de IL17. Os pesquisadores também pretendem analisar amostras de tecido de pacientes que sobreviveram e dos que morreram de sepse para ver se a correlação observada nos camundongos também existe em humanos.
Agência FAPESP