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A lenta deterioração dos catalisadores, que ocorre à medida que a superfície do equipamento é recoberta por uma pátina de óxidos, representa um fator crítico em células de combustíveis – que convertem energia química em energia elétrica e são utilizadas, por exemplo, na propulsão de veículos. Até agora, para responder com exatidão por quanto tempo mais a célula se manteria operante, seria preciso interromper o processo, abrir o dispositivo, retirar o catalisador e analisar sua superfície – algo inviável do ponto de vista prático.

Uma nova metodologia para fazer essa avaliação, que dispensa a caracterização do estado do catalisador, foi apresentada por um grupo de pesquisadores brasileiros e alemães, que teve como coordenador Hamilton Varela, professor do Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP).

Um artigo assinado pelo grupo relatando o resultado, intitulado Coupled slow and fast surface dynamics in an electrocatalytic oscillator: model and simulations, foi publicado como matéria de capa pelo periódico The Journal of Chemical Physics.

Construído a partir da teoria e de simulações computacionais, o artigo apresenta um conjunto de equações que podem ser utilizadas sempre que houver um processo de catálise em regime oscilatório conjugado a um processo de envenenamento lento do catalisador. “Não criamos nenhum material, mas um novo conceito e uma nova metodologia para sua aplicação”, disse Varela à Agência FAPESP.

O ponto de partida para o desenvolvimento do modelo foi um experimento prático, de oxidação de ácido fórmico sobre uma superfície catalisadora de platina e estanho.

O experimento, que contou com apoio da FAPESP, teve o resultado publicado também em 2014 por Varela e colaboradores e recebeu destaque na capa da revista ChemFhysChem, no artigo Long-Lasting Oscillations in the Electro-Oxidation of Formic Acid on PtSn Intermetallic Surfaces.

“Nesse experimento, verificamos que, se era utilizado um catalisador de platina pura, o sistema começava a oscilar e morria rapidamente, devido à oxidação do metal. Substituímos, então, o catalisador de platina por outro, composto de platina e estanho”, disse Varela.

“Constatamos que a adição do estanho incrementava substancialmente a atividade catalítica, retardando a oxidação da superfície do catalisadore estabilizando o processo de reação por mais de 2.200 ciclos oscilatórios. Antes o processo resistia a apenas algumas dezenas de ciclos”, disse.

O novo modelo permite enfrentar problemas como esse e outros de forma muito mais abrangente. “Saímos do específico e fomos para o geral”, comentou o pesquisador.

O segredo é conduzir a reação catalítica de interesse em regime oscilatório. “Investigando a evolução de longo prazo do sistema, percebemos que as características das oscilações mudam à medida que a superfície do catalisador vai sendo recoberta e perdendo atividade”, disse Varela.

“Compreendemos, então, que, se medíssemos a variação das oscilações, poderíamos determinar com precisão o estado do catalisador e fazer previsões sobre o seu funcionamento, sem precisar caracterizar fisicamente sua superfície”, explicou.

“A variação no padrão oscilatório informa sobre a superfície do catalisador. É um conceito inteiramente novo em termos de caracterização e evolução de sistemas”, resumiu.

Conjugação de dinâmicas

Em razão de sua amplitude, o modelo pode ser aplicado em uma grande variedade de fenômenos e não apenas na operação de células de combustíveis. A condição é que haja a conjugação de duas dinâmicas, uma oscilatória e outra de longo prazo.

“Acoplamentos de processos que ocorrem em escalas de tempo completamente diferentes são comuns em toda a natureza. Por exemplo, no corpo humano, o ritmo cardíaco, que se caracteriza por dezenas de batimentos por minuto, está acoplado ao ritmo do envelhecimento, que ocorre muito lentamente. São ritmos que diferem por um fator da ordem de 10 elevado à sexta potência”, comparou Varela.

O pesquisador destacou a afinidade da pesquisa teórica que resultou no novo modelo com o trabalho desenvolvido pelo físico alemão Gerhard Ertl, ganhador do Prêmio Nobel de Química de 2007 exatamente por seus estudos de processos de catálise sobre superfícies metálicas.

Entre 2000 e 2003, Varela fez doutorado no Departamento de Físico-Química do Fritz-Haber-Institut der Max-Planck-Gesellschaft de Berlim, dirigido por Ertl, com bolsa da Sociedade Max Planck. Com bolsa de pós-doutorado da FAPESP, Varela retornou ao Fritz-Haber-Institut e é membro do comitê científico do Ertl Center for Electrochemistry and Catalysis, estabelecido na cidade de Gwangju, na Coreia do Sul, sob a direção do físico alemão. Markus Eiswirth, um dos coautores do artigo do Journal of Chemical Physics, é vice-diretor do Ertl Center.

Na mensagem que escreveu por ocasião do estabelecimento do centro que leva o seu nome, Ertl mencionou os graves problemas que afligem o mundo em relação ao meio ambiente, clima, conversão de energia, matérias-primas e alimentos e destacou o papel da Química, especialmente da conexão entre eletroquímica e catálise, no enfrentamento desses desafios.

Agência FAPESP