Parra realizou a apresentação especial “Controle biológico no Brasil: situação atual e perspectivas” no Simpósio Nacional de Instrumentação Agropecuária, ocorrido de 18 a 20 de novembro, em São Carlos, na unidade de pesquisa em Instrumentação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O professor da USP também representou a FAPESP na abertura do evento.
Coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), “Semioquímicos na Agricultura”, Parra destacou que o Brasil passa pelo momento mais propício para a adoção do controle biológico na lavoura, que consiste no combate a pragas agrícolas por meio de inimigos naturais como, por exemplo, insetos ou até microrganismos como fungos, bactérias, vírus e nematoides.
O INCT é financiado pela FAPESP em conjunto com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
“Chegou o momento do controle biológico no Brasil”, afirmou o professor da USP, que associa essa oportunidade à identificação no país da lagarta Helicoverpa armigera, praga quarentenária que se alimenta de mais de cem tipos de culturas.
Dos algodoais do oeste da Bahia vieram alguns dos primeiros relatos da praga. Também já houve suspeita da lagarta em plantações de feijão em Goiás e no Tocantins e em outras culturas pelo Brasil.
“Como é um inseto de controle muito difícil e o uso indiscriminado de agrotóxicos no Brasil gerou uma série de desequilíbrios, o controle biológico passou a ser indispensável para o controle dessa lagarta”, disse.
Trata-se de uma solução viável, mas que exigirá muita pesquisa nacional, uma vez que não é possível importar soluções prontas de outros países, de acordo com o especialista. “Nossas condições são únicas e o controle biológico deve ser desenvolvido para a nossa realidade”, afirmou Parra.
Esse controle está inserido na filosofia do manejo integrado de pragas (MIP), um conjunto de medidas que visa manter a quantidade de pragas abaixo do nível de dano econômico, respeitando-se critérios econômicos, ecológicos e sociais, de acordo com o professor.
O MIP foi motivado também pelas consequências trazidas pelo uso dos agroquímicos. Parra explicou que, até a década de 1960, os inseticidas tinham uma forte participação no combate de pragas. Em 1948, o químico suíço Paul Müller chegou a ser laureado com o Nobel de Medicina pelo desenvolvimento do DDT, produto que conteve epidemias de tifo e malária ao matar seus insetos vetores. No entanto, descobriu-se que o produto é letal para pássaros e cancerígeno para humanos, o que fez com que fosse banido a partir da década de 1970.
O uso disseminado e indiscriminado de inseticidas também provocou o desenvolvimento de insetos resistentes a esses químicos. Outra consequência indesejada é a contaminação ambiental, que pode levar a problemas como a morte de abelhas, por exemplo.
“Todos esses fatores impulsionaram os trabalhos com controle biológico, que envolve áreas como taxonomia, modelos de simulação, ecologia, bioecologia, seletividade de produtos químicos e várias outras áreas”, detalhou.
Biodiversidade pouco explorada
Um grande desafio para a aplicação do controle biológico no Brasil é o subaproveitamento de uma riqueza natural: a sua ampla biodiversidade. “Apesar de ser imensa, nossa biodiversidade é pouco conhecida, pouco investigada e pouco explorada”, disse Parra, ressaltando que aí poderiam ser encontradas fontes naturais para o combate de pragas.
O Brasil tem dez inimigos naturais disponíveis para a utilização no campo; no mundo, são registrados cerca de 250, segundo Parra. No entanto, o número de pragas conhecidas ultrapassa 500 espécies, o que abre um imenso caminho a ser percorrido pela pesquisa.
As novas metodologias de controle biológico podem utilizar técnicas modernas como sensoriamento remoto com hiperespectrômetros, aparelhos capazes de detectar a presença de insetos na planta, mesmo que estejam sob folhas ou no interior do vegetal.
Com essa técnica, é possível calcular a quantidade de insetos na lavoura com precisão bem maior que os métodos tradicionais, como as armadilhas de feromônios, armadilhas luminosas e a amostragem de insetos por batimento de pano, que consiste em colocar um tecido branco nas entrelinhas da plantação e chacoalhar as plantas para os insetos caírem nele e serem contados.
“Isso é inviável em uma plantação de 50 mil hectares”, argumentou Parra. Por isso, drones equipados com hiperespectrômetros podem mapear a quantidade e a localização dos insetos para que a ação de combate seja direcionada a esses alvos. Os drones também podem fazer uma liberação controlada de inimigos naturais de acordo com a incidência de pragas encontrada.
Essas novas tecnologias levam a outro gargalo: a sua transferência ao produtor. Técnicas modernas exigem mão de obra especializada e um serviço de extensão rural que saiba repassar esses conhecimentos, o que o professor da USP considera um grande desafio.
A logística é outro obstáculo a ser superado devido à grande extensão territorial do Brasil. “Estamos acostumados a falar sobre prazo de validade e tempo de prateleira para patógenos, mas, quando produzimos insetos, isso é mais complexo”, disse. O inimigo natural deve ser lançado no campo no tempo de vida ideal, medido em dias, e seu transporte para lugares distantes tem de ser feito em câmaras frigoríficas.
Ao mesmo tempo, é preciso ter cuidado com predadores como as formigas que atacam a vespinha Trichogramma, um dos insetos mais populares no combate a pragas, inclusive à lagarta Helicoverpa armigera.
De acordo com Parra, o controle biológico será cada vez mais difundido por necessidade e pressão dos mercados. Ele narrou o caso da Espanha, maior produtor mundial de pimentão, que se viu diante da proibição do uso de inseticida nessa cultura. Por conta disso, o país foi obrigado a utilizar controle biológico.
“Estamos vivendo no Brasil um marco para o controle biológico. Se continuarmos aplicando inseticidas de maneira indiscriminada, as pragas vão aumentar. Temos necessidade do controle biológico e condições favoráveis: biodiversidade, mercado agrícola forte e massa crítica de especialistas para desenvolver a área”, disse Parra.
Agência FAPESP