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Em artigo publicado na revista Molecular Cancer, cientistas da Universidade de São Paulo (USP) descreveram um grupo de genes não codificadores de proteína associado a casos de recidiva de câncer renal. “Pela primeira vez, mostramos que RNAs não codificadores de proteínas podem estar relacionados à biologia de um tumor mais agressivo e, portanto, ser alvos potenciais para novos medicamentos”, destacou Sergio Verjovski-Almeida, pesquisador do Instituto de Química da USP e coordenador da pesquisa apoiada pela FAPESP.
Até pouco tempo atrás, toda a parte do genoma que não contém informações para a produção de proteínas – algo em torno de 98% do código genético – foi considerada pela ciência como “DNA lixo”. Novos estudos têm mostrado, porém, que a partir desse DNA se expressam RNAs que atuam modulando o funcionamento de genes vizinhos.

A pesquisa coordenada por Verjovski-Almeida teve como foco os chamados genes intrônicos não codificadores de proteína – aqueles localizados na mesma região de um gene codificador, porém na fita oposta de DNA.

Por uma técnica conhecida como DNA microarray, que permite avaliar a expressão de milhares de genes simultaneamente, os pesquisadores compararam o tecido tumoral de sete pacientes que tiveram recidiva de câncer renal nos primeiros cinco anos de tratamento com o tecido tumoral de outros 11 pacientes que permaneceram livres da doença no período. Compararam também o tecido tumoral desses 18 pacientes com o tecido sadio da região adjacente ao tumor.

“O método padrão de microarray analisa apenas a expressão dos genes codificadores de proteína. Tivemos de desenhar o nosso próprio teste para torná-lo sensível também aos não codificadores”, contou Verjovski-Almeida.

A comparação entre tecido tumoral e não tumoral adjacente revelou 29 genes intrônicos não codificadores diferencialmente expressos nos dois grupos. Outros 26 não codificadores estavam com a expressão alterada na comparação entre os que tiveram e os que não tiveram recidiva. Apenas dois genes não codificadores apareceram em comum nas duas análises. Todos os pacientes estavam em tratamento no Instituto Nacional de Câncer (Inca) e tiveram o rim totalmente retirado.

“A expressão alterada nesses genes pode ser indicativo da agressividade do tumor. No entanto, seria preciso validar esses achados em um grupo maior e independente de pacientes para que eles possam, de fato, serem usados como marcadores”, ponderou o pesquisador.

Correlações

O passo seguinte da pesquisa foi verificar, entre os genes intrônicos não codificadores de proteína expressos em tumor de rim, quais estavam correlacionados – positiva ou negativamente – à expressão de genes codificadores de proteína.

“A ideia era identificar se o aumento na expressão de um não codificador faria aumentar ou diminuir a expressão de genes codificadores. Fizemos essa análise com tecido tumoral de rim e com tumores de próstata e de fígado, para comparar”, contou Verjovski-Almeida.

A análise mostrou relação entre 700 genes codificadores de proteína e 109 não codificadores. Isso significa que cada gene intrônico não codificador estava regulando o funcionamento de, em média, sete genes codificadores de proteína nos tecidos analisados.

“Cerca de 22% desses genes não codificadores estavam regulando funções de genes codificadores no mesmo locus, ou seja, na mesma região do genoma, mas na fita oposta do DNA. Os outros 78% estavam regulando a função de genes localizados em outras regiões do genoma”, afirmou Verjovski-Almeida.

A análise sugere ainda que, indiretamente, esses genes não codificadores afetam importantes funções renais, como transporte de íons, transporte de prótons, adesão celular, resposta ao estresse e a processos inflamatórios.

“É uma rede complexa. Quando a expressão de um gene se altera, modifica várias funções críticas do órgão. São necessários novos estudos para entender por que esse conjunto de genes não codificadores está sendo expresso de forma diferente no tecido tumoral. Somente então poderemos pensar em intervenções para aumentar a expressão dos que estão diminuídos e vice versa”, avaliou o pesquisador.

Segundo Verjovski-Almeida, no entanto, estudos do gênero são prejudicados pela dificuldade na obtenção de amostras de pacientes. Além de o câncer renal ser relativamente raro, não é forte entre os médicos da área a cultura de armazenar tecido para pesquisas futuras.

“O que pretendemos fazer, em um primeiro momento, é verificar se genes sabidamente envolvidos em câncer estão sendo regulados por não codificadores. Diversos estudos mostram, por exemplo, que a expressão dos genes codificadores RAB31 e RAB25 está diminuída em pacientes com câncer. Existe a possibilidade de eles estarem sendo regulados por não codificadores do mesmo locus. Vamos explorar casos como esse”, disse Verjovski-Almeida.

Agência FAPESP