O encontro também teve a participação de Heitor Cantarella, pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), e de Antonio José de Almeida Meirelles, professor da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O evento foi coordenado por Glaucia Mendes de Souza, professora do Instituto de Química da USP e membro da coordenação do BIOEN.
De acordo com dados apresentados por Van Sluys, entre 1961 e 2010 o trigo e o milho – plantas consideradas “primas-irmãs” da cana-de-açúcar – tiveram aumento da eficiência de produção por hectare muito superior ao registrado pela cana.
Uma das possíveis respostas para justificar essa diferença, de acordo com a pesquisadora, é que o trigo e o milho contam com programas de melhoramento assistido pela genômica que ainda não existem para a cana-de-açúcar. Isso porque ainda se sabe pouco sobre o genoma da gramínea.
“A construção de um banco de dados contendo informações do genoma da cana-de-açúcar vai nos permitir fazer uma abordagem um pouco mais integrada e chegar a um ponto de melhoramento genético que é utilizado hoje em milho e trigo. No caso da cana, estamos montando essa base de dados a partir do zero”, afirmou.
Programas de pesquisa
Segundo Van Sluys, para desenvolver biotecnologia voltada ao melhoramento de cultivares é preciso conhecer e entender muito bem a estrutura biológica da planta. No caso da cana-de-açúcar, esse desafio é ainda maior.
A planta cultivada hoje é uma variedade híbrida, derivada do cruzamento da espécie Saccharum officinarum com a Saccharum espontaneum, na qual a primeira contribui com a produção de açúcar e a segunda confere à planta vigor e resistência a uma série de pragas agrícolas.
Diferentemente do que ocorre com os seres humanos, em que a contribuição genética do pai e da mãe para seus filhos é igual – cada um contribui com 50% dos genes –, no caso da cana-de-açúcar a participação genética das duas espécies é desigual. A Saccharum officinarum contribui com, aproximadamente, 75% do genoma da planta, enquanto a Saccharum espontaneum participa com os 25% restantes.
Além disso, ainda em comparação com os humanos, que têm 23 pares de cromossomos, a planta possui muito mais, além de ter muito mais sequências repetidas de genes em cada um deles. “Os seres humanos têm em torno de 50% do genoma repetido, enquanto a cana-de-açúcar é capaz de ter muito mais, talvez não tanto quanto algumas variedades de milho, entre as quais esse percentual pode ser de 80%”, disse Van Sluys.
O fato de ser um organismo híbrido, ter um genoma muito grande e com muitas repetições, torna o melhoramento genético da cana-de-açúcar muito desafiador, ressaltou a pesquisadora.
“Existem várias ações realizadas no Brasil, de pouco mais de dez anos para cá, que estão nos ajudando a estabelecer uma base para tornar a biotecnologia eficiente para aumentar a produtividade da cana-de-açúcar”, disse.
Entre essas ações estão o Programa BIOEN da FAPESP e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol – um dos INCTs apoiados pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no Estado de São Paulo.
“Queremos identificar novos caminhos para a manipulação genética do metabolismo de energia de plantas cultivadas, a exemplo do que se faz com o milho”, disse Van Sluys.
Nos últimos anos, os pesquisadores participantes do programa começaram a desenvolver um banco de dados para armazenamento de informações do genoma da cana-de-açúcar.
Quando for concluído, o banco de dados genéticos da cana-de-açúcar possibilitará, eventualmente, incluir a transgenia (manipulação genética) nos programas de melhoramento da planta.
“A partir de ferramentas genômicas que estão sendo construídas, da parceria com os programas de melhoramento e da compreensão da fisiologia da cana-de-açúcar, estamos começando a ser capazes de formar redes gênicas e distinguir, por exemplo, genes de Saccharum officinarum dos de Saccharum espontaneum nas variedades cultivadas”, disse Van Sluys.
Agência FAPESP