Por meio desses dados, os usuários podem realizar análises temporais e combinar observações realizadas em vários comprimentos de onda de energia irradiada pelos corpos celestes, como raios X, radiação infravermelha, ultravioleta e gama e ondas de rádio, para elucidar os processos físicos que ocorrem no interior desses objetos e compartilhar suas conclusões.
Denominado World Wide Telescope, o software, que começou a ser desenvolvido em 2002 pela Microsoft Research, em parceria com pesquisadores da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, é um exemplo de como as novas tecnologias da informação e comunicação (TICs) mudaram a forma como os dados científicos passaram a ser gerados, administrados e compartilhados, além da própria maneira como se faz ciência hoje, afirma Tony Hey, vice-presidente da Microsoft Research.
“Os telescópios espaciais, assim como as máquinas de sequenciamento genético e aceleradores de partículas, estão gerando um volume de dados até então nunca visto. Para lidar com esse fenômeno e possibilitar que os cientistas possam manipular e compartilhar esses dados, precisamos de uma série de tecnologias e ferramentas de ciência da computação que possibilitem fazer ciência de forma melhor, mais rápida e com maior impacto. É isso o que chamamos de eScience”, disse Hey durante o Latin American eScience Workshop 2013, realizado nos dias 14 e 15 de maio no Espaço Apas, em São Paulo.
Promovido pela FAPESP e pela Microsoft Research, o evento reuniu pesquisadores e estudantes da Europa, da América do Sul e do Norte, da Ásia e da Oceania para discutir avanços em diversas áreas do conhecimento possibilitados pela melhoria na capacidade de análise de grandes volumes de informações produzidas por projetos de pesquisa.
A cerimônia de abertura do evento foi presidida por Celso Lafer, presidente da FAPESP, e contou com a presença de Michel Levy, presidente da Microsoft Brasil, e de José Tadeu de Faria, superintendente do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no Estado de São Paulo, representando o ministro.
Também conhecida como ciência orientada por dados, a área de eScience integra pesquisas em computação a estudos nas mais variadas áreas por meio do desenvolvimento de softwares específicos para visualização e análise de informações.
A integração permite a interpretação dos dados, a formulação de teorias, testes por simulação e o levantamento de novas hipóteses de pesquisa com base em correlações difíceis de serem observadas sem o apoio da tecnologia da informação.
“Algumas tecnologias utilizadas na ciência da computação vão ajudar a resolver problemas científicos. Em contrapartida, a utilização dessas ferramentas para solucionar problemas científicos também possibilitará o próprio desenvolvimento da ciência da computação”, disse Hey, que foi professor da Universidade de Southampton, no Reino Unido.
Segundo Hey, a análise, visualização, prospecção (data mining, na expressão em inglês), preservação e compartilhamento de grandes volumes de dados representam grandes desafios não só na ciência hoje, mas também no setor privado.
Por isso, na opinião dele, é preciso treinar os cientistas para lidar com o big data – como é chamado o conjunto de soluções tecnológicas capaz de lidar com a acumulação contínua de dados pouco estruturados, capturados de diversas fontes e da ordem de petabytes (quatrilhões de bytes) – tanto para realização de projetos científicos, como também para atuarem, eventualmente, em empresas. “O data scientist [cientista capaz de lidar com grandes volumes de dados] será um requisito imprescindível para o cientista”, disse Hey.
A ciência intensiva em dados não é nova, mas as escalas espaciais e temporais de estudos realizados atualmente sobre temas relacionados às mudanças climáticas globais, por exemplo, são cada vez maiores, exigindo novas ferramentas. Por meio de novas tecnologias da informação, também é possível analisar dados gerados em tempo real, como no monitoramento de hábitats.
De acordo com Hey, desde 1950 se começou a utilizar computadores para explorar, por meio de simulações, áreas da ciência até então inacessíveis. “No início, no entanto, os cientistas não sabiam o que era ciência da computação e os profissionais da computação não entendiam a complexidade dos problemas científicos”, disse.
“Foi necessária a realização de um trabalho conjunto, de longo prazo, para que os dois lados entendessem qual era a contribuição que cada um poderia dar em suas respectivas áreas, e iniciar o desenvolvimento de novos algoritmos, hardware, software e da programação de linguagens para possibilitar a realização de experimentos em diversas áreas”, contou.
Oportunidades em temas ousados
Durante o evento da FAPESP e da Microsoft Research foram apresentados diversos projetos por pesquisadores que utilizam o eScience em diversos países, em áreas como energias renováveis, mudanças climáticas globais, transformações sociais, econômicas e políticas nas metrópoles contemporâneas, caracterização, conservação, recuperação e uso sustentável da biodiversidade, medicina e saúde pública.
Um desses projetos, coordenado pela professora Glaucia Mendes Souza, coordenadora do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN), pretende desenvolver um algoritmo para o sequenciamento do genoma da cana-de-açúcar e, com isso, possibilitar o desenvolvimento de variedades da planta com maior quantidade de sacarose e mais resistente a pragas e às mudanças climáticas.
“A colaboração entre a FAPESP e a Microsoft tem aberto para a comunidade científica do Estado de São Paulo inúmeras oportunidades de realizar pesquisas em temas ousados relacionados com o uso de tecnologias da informação em áreas como a de energia e meio ambiente”, disse Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, na sessão de abertura do workshop.
“Temos grandes expectativas em relação à eScience. Se soubermos utilizá-la adequadamente, ela poderá trazer grandes avanços não só em pesquisas mas também na própria maneira de se fazer ciência”, disse Brito Cruz.
Ele disse que a FAPESP planeja lançar em breve um programa voltado para apoiar pesquisas na área de eScience.
“Temos a clara convicção de que um papel importante da FAPESP é estar na vanguarda da inovação e do conhecimento, e consideramos muito importante o apoio à pesquisas em eScience, cuja aplicação em áreas como a de meio ambiente é inequívoca, mas que também apresenta um grande potencial de utilização nas Ciências Humanas, por exemplo”, disse Celso Lafer, presidente da FAPESP.
Levy destacou a parceria da Microsoft com a FAPESP e os investimentos em pesquisa e desenvolvimento realizados pela empresa no país. “A Microsoft tem aumentado seus investimentos na área de pesquisa e desenvolvimento no Brasil nos últimos anos e um dos mais importantes exemplos disso é a parceria bem sucedida que mantemos com a FAPESP”, afirmou.
Agência FAPESP