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“De que falamos quando falamos sobre robôs?”, pergunta Sherry Turkle, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), parafraseando o célebre conto What we talk about when we talk about love, de Raymond Carver (1938-1988), sobre os altos, baixos, as sutilezas e incertezas dos relacionamentos amorosos. Turkle é professora de Estudos Sociais em Ciência e Tecnologia e dirige um programa no MIT que pesquisa as relações do ser humano com a tecnologia.
A autora de best-sellers científicos como The Second Self: Computers and the Human Spirit (1984) e Simulation and Its Discontents (2009) foi uma das principais atrações da reunião anual da American Association for the Advancement of Science (AAAS), realizada de 14 a 18 de fevereiro em Boston, Estados Unidos, quando falou para uma plateia de cerca de 1,2 mil pessoas.

Muito além do cinema, os robôs estão em linhas de montagem em fábricas, em explorações nas profundezas dos oceanos e realizando atividades perigosas para o homem, seja em vulcões ou em usinas nucleares com vazamento. Mas Turkle não está interessada nesses tipos de máquinas, e sim em robôs projetados para o relacionamento com pessoas.

“Estamos no que chamo de 'momento robótico'. E isso não porque construímos robôs merecedores de nossa companhia, mas porque estamos prontos para a companhia deles”, disse Turkle. Um cenário que traz otimismo, mas também riscos, de acordo com a cientista.

Turkle mencionou a revista Wired, cuja matéria de capa da edição de janeiro “celebrou como os robôs estão assumindo papéis em cada aspecto de nossas vidas”. Robôs na forma de brinquedos e bonecas, animais de estimação e enfermeiros para cuidar de doentes. Produtos com inteligência artificial não apenas nas tradicionais formas humanoides, mas imperceptíveis e ao mesmo tempo onipresentes, como o assistente digital Siri, que ocupa os mais novos iPhones e iPads e responde aos pedidos dos usuários.

“A mensagem da reportagem é típica de como o assunto vem sendo tratado há décadas. Trata-se de um argumento com duas partes. Na primeira, os robôs nos tornam mais humanos ao ampliar alternativas de relacionamento, uma vez que agora podemos nos relacionar com eles. Ou seja, eles seriam uma 'nova espécie'. A segunda parte do argumento é que não importa o que as pessoas façam, se um robô puder ser inserido naquele papel, o papel não é, por definição, humano. E isso inclui as tarefas de conversar ou de tomar conta de uma pessoa, por exemplo”, disse Turkle.

“Leciono no MIT, onde muitos concordam com essa posição. Isso significa que há anos alguns de meus colegas mais brilhantes têm investigado a questão dos robôs como companhia humana. Um de meus estudantes usou até mesmo a voz de sua filha para um robô-boneca que desenvolveu, o My Real Baby, um sucesso cuja propaganda destaca a capacidade de ensinar habilidades de socialização a crianças”, contou.

“Foi no MIT que conheci a ideia da robótica social, por meio da qual os pesquisadores imaginam robôs como professores, assistentes e melhores amigos para pessoas solitárias, jovens ou idosos. Em uma pesquisa que fiz sobre o tema, um dos entrevistados inclusive destacou que preferia poder ter um robô para cuidar de sua mãe idosa do que contratar uma pessoa desconhecida. Outra disse gostar mais da ideia de ter um robô do que uma babá na qual não confiasse”, disse.

Turkle considera que há muitas formas em que robôs ou sistemas de inteligência artificial podem e poderão ser muito úteis no dia a dia, mas alerta para o risco de se depender em demasia dessa possibilidade aberta pela tecnologia. Robôs são máquinas, não substitutos de pessoas.

“Então, de que falamos quando falamos sobre robôs? Falamos de nossos próprios medos e de nossas decepções conosco e com o próximo. Falamos de nossa falta de comunidade. De nossa falta de tempo. As pessoas sonham com robôs que resolvam seus problemas particulares e suas dificuldades de relacionamento”, disse Turkle.

“Mas eu vejo um caminho diferente. Espero que, ao falar sobre o equívoco de imaginar a salvação por meio da companhia de robôs, eu possa colocar uma sombra sobre esse encantamento. Talvez possamos nos dedicar ao potencial de como a tecnologia robótica pode nos ajudar de diferentes maneiras. Ou simplesmente nos dedicar a desenvolver esse potencial em nós mesmos. Minha principal restrição a respeito de amigos artificiais é muito simples: se gastamos tempo com eles, passamos menos tempo entre nós. Ou com nossos pais, filhos e amigos”, disse.

Agência FAPESP