A conclusão é de um estudo anunciado nesta quinta-feira (14/02), durante a reunião anual da American Association for the Advancement of Science (AAAS), em Boston, nos Estados Unidos.
A pesquisa foi conduzida por um grupo internacional de cientistas, que analisou quatro anos de dados obtidos por meio do telescópio espacial de raios gama Fermi, da Nasa. É a primeira evidência considerada inequívoca da origem dos raios cósmicos. Os resultados da pesquisa também foram publicados na nova edição da revista Science.
Os cientistas identificaram sinais de duas supernovas antigas (a W44, a 5 mil anos-luz da Terra, e a IC 443, a 10 mil anos-luz), cujas ondas de choques produzidas por suas explosões aceleraram prótons a velocidades próximas à da luz, transformando as partículas naquilo que se convencionou chamar de raios cósmicos.
De acordo com o líder do estudo, o astrofísico alemão Stefan Funk, da Universidade Stanford e do Instituto Kavli para Partículas Astrofísicas e Cosmologia do Departamento de Energia dos Estados Unidos, quando esses prótons carregados de energia se chocam com prótons estáticos em meio a gás ou poeira estelar, o resultado é a produção de raios gama com características distintas.
“Raios cósmicos não são exatamente raios, mas basicamente prótons. No entanto, não são todas as partículas subatômicas aceleradas em uma supernova que se transformam em raios cósmicos, e sim uma pequena parte”, disse Funk.
De acordo com o cientista, prótons compõem mais de 90% dos raios cósmicos que atingem a atmosfera terrestre na forma de duchas de partículas, produzindo radiação.
“Eles nos acertam o tempo todo, mas não fazem mal e correspondem a uma ínfima parte da radiação no planeta. Durante a história do Sistema Solar, porém, essas partículas têm sido muito importantes, tendo influenciado a evolução da galáxia”, disse Funk. “Uma característica que acho especial nos raios cósmicos é que eles têm origem a partir das maiores explosões em nossa galáxia, que aceleram as menores das partículas.”
Píons
Os cientistas há anos estipulavam que as duas fontes mais prováveis para a produção de raios cósmicos seriam explosões de supernovas na Via Láctea ou jatos de energia derivados de buracos negros além da galáxia. Isso por causa da dimensão dos fenômenos, uma vez que, para lançar partículas por toda a galáxia, a fonte teria que ter uma energia suficiente para tanto. Mas até o momento não haviam sido encontradas evidências que comprovassem essas suspeitas.
A explosão estelar conhecida como supernova é capaz de irradiar energia equivalente à que o Sol emitirá durante toda a sua existência. As ondas de choque de uma supernova aceleram os prótons até os transformarem em raios cósmicos, em um processo no qual os prótons são presos nas regiões de choque – que se aceleram cada vez mais – por campos magnéticos.
“As energias desses prótons estão muito além do que os maiores aceleradores de partículas da Terra, como o LHC, são capazes de produzir”, disse Funk.
As colisões entre os prótons cada vez mais rápidos e prótons que se movem bem mais lentamente – e que ocorrem em nuvens de poeira e gás – levam à formação de partículas neutras conhecidas como píons.
Essas partículas subatômicas – descobertas na década de 1940 pelo brasileiro Cesar Lattes, o italiano Giuseppe Occhialini e o britânico Cecil Powell –, por sua vez, decaem em raios gama, uma forma de luz altamente energética. E foi justamente esse decaimento com sua assinatura específica em raios gama que pode ser identificado por telescópios espaciais como o Fermi e comprovou a origem dos raios cósmicos.
“Até agora, tínhamos apenas cálculos teóricos e o senso comum para nos guiar na ideia de que os raios cósmicos têm origem em supernovas. A detecção direta das assinaturas do decaimento dos píons em restos de supernova fecha o circuito, ao fornecer evidências observacionais de um componente significativo dos raios cósmicos”, disse Jerry Ostriker, da Universidade Columbia, também envolvido na descoberta.
Na próxima etapa da pesquisa, o grupo tentará compreender os detalhes do mecanismo de aceleração e as energias máximas com que a explosão de uma supernova podem acelerar prótons.
“É interessante destacar que essa descoberta ocorre no momento em que celebramos o 100o aniversário da descoberta dos raios cósmicos”, disse Roger Blandford, diretor do Kavli Institute, que participou da análise dos dados obtidos no Large Area Telescope do Fermi.
O artigo Detection of the Characteristic Pion-Decay Signature in Supernova Remnants (10.1126/science.1231160) pode ser lido por assinantes da Science em www.sciencemag.org.
Agência FAPESP