Uma nova categoria de materiais poliméricos, que são desenvolvidos por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), pode, entre outras façanhas, ajudar a baratear os polímeros biodegradáveis disponíveis atualmente no mercado, além de dar origem a diversas soluções nas áreas da medicina e ambiente.
Possibilidades de desenvolvimento desses novos materiais, denominados sistemas poliméricos nanoestruturados, foram apresentadas na First São Carlos School of Advanced Studies in Materials Science and Engineering (SanCAS-MSE) – Primeira Escola São Carlos de Estudos Avançados em Engenharia e Ciências dos Materiais, realizada entre os dias 25 e 31 de março.
Realizado no âmbito da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA), modalidade de apoio da FAPESP, o evento foi organizado pelo Departamento de Engenharia e Ciências dos Materiais (DEMa) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), sob a coordenação dos professores Edgar Zanotto, Elias Hage Junior e Walter Botta Filho.
Por meio de um Projeto Temático, realizado com apoio da FAPESP, os pesquisadores da UFSCar começaram a desenvolver e a caracterizar nos últimos anos diversos materiais nanoestruturados.
Compostos por partículas de materiais cerâmicos e poliméricos, com dimensões em escala nanométrica (da bilionésima parte do metro), dispersas em uma matriz polimérica, esses novos materiais apresentam melhores propriedades mecânicas, ópticas e de transporte do que os polímeros convencionais.
“A combinação de nanopartículas com a matriz polimérica confere melhores propriedades mecânicas, ópticas e de transporte ao plástico final. No caso, por exemplo, de produtos como sacolas plásticas, também possibilita diminuir a quantidade de polímero biodegradável e o custo do material final, melhorando suas propriedades mecânicas e de transporte e mantendo a capacidade de mais rápida degradação em comparação com os polímeros tradicionais”, disse Rosario Elida Suman Bretas, professora da UFSCar e coordenadora do projeto, à Agência FAPESP.
Esses novos sistemas poliméricos nanoestruturados têm diversas aplicações na área de embalagens, uma vez que diversos polímeros comerciais possuem limitações para serem utilizados para esse fim, como não apresentarem a transparência necessária.
Ao misturá-los com outros polímeros em escala nanométrica que apresentam um comportamento mais adequado para serem utilizados como embalagem, originando o que se chama de nanoblenda, é possível melhorar as propriedades e manter o sistema polimérico transparente.
“As propriedades mecânicas dos dois polímeros são modificadas quando eles são misturados. Às vezes um reforça ou melhora a estabilidade química do outro”, disse Hage, um dos pesquisadores principais do projeto.
Outras possíveis aplicações desses novos materiais são na medicina, para o desenvolvimento de nanofibras poliméricas que servem de suporte de crescimento e diferenciação de células-tronco.
Formadas por polímeros com diâmetro nanométrico, nos quais são incorporadas nanopartículas de compostos biocompatíveis com o corpo humano, como a hidroxiopatita (mineral que representa 70% da composição dos ossos), as nanofibras compõem um emaranhado que é muito parecido com a matriz extracelular, que sustenta as células humanas. Ao colocar células sobre esse emaranhado de nanofibras, elas se sentem “em casa” e se ancoram no material, conforme observaram os pesquisadores do DEMa em trabalhos realizados em conjunto com cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade de Strasbourg, na França.
“O plástico tem proporcionado saídas espetaculares em certas áreas como a medicina devido ao fato de a maior parte dos polímeros ser biocompatível com o corpo humano”, disse Bretas.
Na área ambiental, uma das possibilidades de aplicação dos sistemas poliméricos nanoestruturados está em sensores para medir pH (acidez). Os pesquisadores acabaram de desenvolver um tecido com essa finalidade, composto pela incorporação de polianilina (um polímero que muda de cor de acordo com a condutividade) na forma nanométrica disperso em outro polímero, a poliamida 6 (náilon).
“Estamos desenvolvendo esses produtos em escala de laboratório e ainda deverá levar um tempo para serem produzidos em escala industrial, principalmente porque são caros e é preciso incorporar um gasto de energia muito maior do que necessário para produzir os polímeros convencionais”, disse Bretas.
Um dos desafios tecnológicos com que os pesquisadores se defrontam para realizar essas misturas de polímeros é compatibilizar as características deles. Apesar de terem a mesma origem (são todos orgânicos), eles apresentam propriedades e características diferentes.
Outro grande desafio é dispersar e distribuir as partículas em escala nanométrica dentro da massa geralmente fundida da matriz de polímero que, em função de suas forças viscoelásticas, faz com que as nanopartículas se agreguem, formando aglomerados – enquanto o ideal é que as nanopartículas permaneçam longe uma das outras para, dessa forma, reforçarem as propriedades do plástico final. “É como se tentasse pegar mel quente e distribuir dentro dele partículas que são invisíveis a olho nu”, comparou Bretas.
Para desenvolver esses novos materiais, os pesquisadores utilizam os mesmo equipamentos empregados para produção dos plásticos convencionais, como extrusoras. Entretanto, de acordo com Bretas, talvez será preciso, no futuro, utilizar outros processos.
Aulas práticas
Durante a Primeira Escola São Carlos de Estudos Avançados em Engenharia e Ciências dos Materiais, os pesquisadores da UFSCar deram aulas práticas aos estudantes de pós-graduação brasileiros e estrangeiros participantes sobre como desenvolvem e caracterizam nanocompósitos poliméricos, utilizando os equipamentos de que dispõem no DEMa.
As atividades complementaram as aulas teóricas proferidas por cientistas estrangeiros especialistas em processamento e propriedades de compósitos poliméricos, como József Karger-Kocsis, professor de engenharia de polímeros da Budapest University of Technology and Economics, na Hungria, Ica Manas-Zloczower, professora da University Cleveland, em Ohio, e Ramani Narayan, professor da Michigan State University, as duas últimas nos Estados Unidos.
Referência na área de polímeros à base de outras matérias-primas que não o petróleo, como da cana-de-açúcar, Narayan demonstrou em sua palestra a importância em termos energéticos desse tipo de plástico, denominado biobase, que apesar de ser proveniente de fonte renovável demanda o mesmo tempo para ser degradado do que os polímeros utilizados, por exemplo, nas sacolas plásticas convencionais.
Agência FAPESP