Em texto publicado no periódico, Artaxo conta como um grupo de cientistas colocou em prática “um ambicioso plano para estudar a floresta amazônica de uma forma totalmente nova, para melhorar a nossa compreensão da floresta e seu papel no sistema climático global”. O intuito era construir uma base científica para aprender como a região poderia ser desenvolvida de forma sustentável.
Especialista em mudanças climáticas, o físico deu este depoimento a convite da Nature, após ter redigido um primeiro artigo, para a mesma edição, em que sintetizava os resultados das pesquisas realizadas pelo LBA.
Chamou a atenção dos editores a capacidade do projeto em agregar, por 20 anos, cientistas de diferentes setores e nacionalidades, em torno do complexo objetivo. O LBA envolve cerca de 1100 de pesquisadores e estudantes, produziu mais de dois mil trabalhos publicados e mais de 300 teses e dissertações, sendo o maior experimento científico ambiental em execução atualmente. “Este é um feito não desprezível para o Brasil – vários países tentaram ações semelhantes e não conseguiram. Entrou governo, saiu governo, e nós continuamos com nosso experimento, até ele ter o sucesso que tem hoje”, comemora Artaxo.
Organização
Na prática, procurou-se conduzir um estudo integrado, em que físicos, químicos e biólogos trabalhassem juntos em projetos de pesquisa, em que cada um atua na sua área, mas leva em conta o que está sendo produzido nas outras. “É a única maneira de entender um ecossistema tão complexo como a Floresta Amazônica”, ressalta o professor.
O docente do IF coordena 15 cientistas que, por sua vez, lideram equipes de pesquisadores na execução dos estudos em suas respectivas especialidades. Segundo ele, a USP em especial é um terreno fértil para integração de conhecimento, como destaca:
“O Brasil tem um papel de liderança científica na questão das mudanças climáticas. Em muitas áreas de pesquisa, a exemplo da química atmosférica, estamos no mesmo nível de países que sediam as melhores universidades do mundo – e a USP obviamente tem um papel significativo nisso”.
Os diversos projetos associados ao LBA são financiados, entre outros, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), INPA, Ministério da Ciência e Tecnologia, e pela pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Pesquisa
Membro da equipe do Painel Internacional de Mudanças Climáticas (IPCC) premiada com o Nobel da Paz de 2007, o cientista focaliza em seus estudos o balanço de radiação da atmosfera amazônica.
Para isso, leva em consideração o papel de partículas de aerossóis, tanto emitidos naturalmente pela vegetação, quanto em processos de queimadas na Amazônia. “Trabalho a questão das alterações nos ciclos biológicos, nos mecanismos de formação e desenvolvimento de nuvens e alterações na taxa de precipitação. Os processos que regulam a concentração de gases e de partículas sólidas na atmosfera amazônica, e a biologia, química e física associadas”, conta.
De acordo com Artaxo, o LBA não é um estudo tecnológico, visando o desenvolvimento de produtos, mas sim diversas pesquisas que buscam entender o funcionamento dos ecossistemas tropicais, o que é essencial na questão das mudanças climáticas globais. “O que vai acontecer com a Floresta Amazônica, onde será alocado aquele carbono que hoje está armazenado na biomassa?”, questiona, citando que a floresta guarda cerca de cem milhões de toneladas de carbono, o que equivale a 10 anos de queima de petróleo pelo mundo todo. E adverte:
“É uma quantidade gigantesca de carbono que, se for mobilizada rapidamente para a atmosfera, pode causar alterações climáticas muito fortes”.
Uma floresta que polui
Tal problema pode se dar tanto pela ação humana, com as queimadas e agricultura, quanto pelas próprias mudanças climáticas, que podem fazer com que a vegetação se torne preponderantemente emissora de carbono.
“No artigo da Nature, estudamos o papel das secas de 2005 e 2010 na alteração do funcionamento natural da floresta. Observamos que, naturalmente, a floresta absorve CO2 da atmosfera, em concentrações relativamente grandes, mas que, durante o período de seca, a floresta inverteu este papel, perdendo parte do carbono para a atmosfera”, explica Artaxo.
O balanço de carbono na floresta é regulado pela fotossíntese, que absorve CO2 da atmosfera e fixa na biomassa, e pela decomposição da própria floresta, que se renova frequentemente. Na floresta tropical, uma árvore grande morre e em questão de alguns anos se decompõe completamente, diferentemente do que acontece na Finlândia, por exemplo, em que o clima é muito mais frio e seco, e o processo mais lento, preservando o carbono naquele ecossistema.
“Quantificamos o processo na Amazônia e mostramos que lá o ecossistema pode estar saindo de um equilíbrio em que esteve ao longo de milhões de anos para entrar em um novo, em que emite constantemente carbono para a atmosfera, mais do que absorve”, conclui o docente.