O primeiro autor do artigo, Rodrigo Mendes, atualmente pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Meio Ambiente, participou do estudo durante seu pós-doutorado na Universidade de Wageningen, na Holanda, entre 2009 e 2010. Entre 2003 e 2008, Mendes cursou o doutorado na Universidade de São Paulo (USP), com Bolsa da FAPESP.
O estudo identificou 33 mil bactérias associadas, de forma consistente, à supressão de doenças. Segundo Mendes, o estudo, que ganhou comentário na revista Nature Biotechnology, concluiu que o fenômeno de supressão de doenças não depende apenas da atuação de bactérias isoladas, mas também da sinergia de todo um consórcio de bactérias. Os dados indicam que essa combinação específica de microrganismos é ativada por uma sinalização no contexto da própria comunidade bacteriana.
“Um dos pontos fortes do estudo é que ele teve um enfoque transversal, abrangendo desde a observação de campo, passando pela identificação da comunidade, dos grupos bacterianos, do gênero, da espécie, das linhagens específicas dos microrganismos e de seus genes, até chegar aos metabólitos utilizados pela bactéria para defender a planta do patógeno”, disse à Agência FAPESP.
Um dos objetivos gerais da pesquisa era contribuir para a compreensão de como as plantas utilizam e dependem da comunidade microbiana associada a elas para sobreviver. Mendes explica que estudos semelhantes são frequentemente realizados em mamíferos.
“Sabemos, por exemplo, que o homem depende, para sobreviver, de nutrientes e bactérias que estão presentes nos nossos intestinos ou na nossa pele. Muitas vertentes de literatura consideram, por isso, que o homem, por viver em conjunto com esses microrganismos, é um superorganismo, ou um microbioma. Aplicamos essa mesma visão às plantas, observando-as não só como um organismo hospedeiro, mas como um microbioma”, explicou.
O estudo teve foco especificamente nos microrganismos que vivem associados à raiz das plantas. À medida que são infectadas, as plantas expostas aos patógenos do solo sofrem pressão positiva para recrutar as bactérias necessárias para sua proteção. O solo é considerado supressivo quando essa comunidade de bactérias é tão bem selecionada que, mesmo na presença do patógeno, a planta não é infectada.
“Em um extremo, há o solo supressivo no qual a planta resiste completamente à presença do patógeno. No outro extremo está aquele solo no qual a planta morre na hora ao ser exposta ao patógeno. Nossa estratégia foi avaliar, em um solo semelhante, seis níveis diferentes de supressão de doenças. O que diferenciava essas seis porções de solo era justamente a estrutura da comunidade bacteriana neles presente”, explicou Mendes.
Controle biológico indireto
O primeiro passo da pesquisa consistiu na observação de campo, a fim de identificar os lugares em que a infecção aparecia. Em seguida, os pesquisadores analisaram a comunidade bacteriana presente nos seis níveis diferentes de proteção do solo, identificando quais grupos desempenhavam algum papel nessa proteção.
Na fase seguinte foram selecionados e isolados alguns grupos-alvo, em uma prova de princípio, para mostrar que grupos específicos estavam relacionados à proteção no campo.
“Um dos grupos que usamos para provar esse fenômeno é um grupo bem estudado, que algumas vezes foi associado com solos supressivos. Mas isso nunca tinha sido observado em tamanho grau de detalhamento. Nosso estudo revelou um conjunto muito maior do que se imaginava de grupos bacterianos diferentes associados à proteção”, afirmou.
Segundo Mendes, o estudo poderá contribuir para a futura descoberta de novas moléculas e compostos antibióticos que possam ser utilizados no controle biológico de doenças de plantas.
“Podemos até mesmo pensar em um controle biológico indireto, isto é, em vez de apostar na introdução no solo de um componente biológico de proteção, os genes da planta podem ser manipulados para que ela selecione com mais eficiência os microrganismos que aumentam seu nível de proteção”, disse.
Para que a alternativa da engenharia genética seja possível, no entanto, Mendes lembra que será preciso antes compreender com precisão o funcionamento da comunicação entre a planta e os grupos de bactérias de interesse.
“Demonstramos que a planta utiliza esse recurso. Agora temos que entender como a planta se comunica com esse microbioma. A partir daí será possível manipular a planta para que ela aprimore sua capacidade de seleção microbiana”, disse.
O artigo Deciphering the Rhizosphere Microbiome for Disease-Suppressive Bacteria (DOI: 10.1126/science.1203980), de Rodrigo Mendes e outros, pode ser lido por assinantes da Science em www.sciencemag.org/content/332/6033/1097.full.
Agência FAPESP