O discurso inaugural do evento foi feito por Ahmed Djoghlaf, secretário executivo da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CBD, na sigla em inglês). Os trabalhos foram abertos por Maximiliano da Cunha Henriques Arienzo – subchefe da Divisão de Meio Ambiente do Itamaraty, chefe da delegação e principal negociador brasileiro em Nagoya – com a apresentação de um relatório sobre a COP10.
Além de Djoghlaf e Arienzo, participaram da reunião negociadores brasileiros que também tiveram papel central nas negociações na conferência no Japão, como Braulio de Souza Dias, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), e David Oren, coordenador de Gestão de Ecossistemas e Biodiversidade do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). A mesa de abertura teve ainda a presença de Celso Lafer, presidente da FAPESP, e de Carlos Alfredo Joly, coordenador do Programa Biota-FAPESP.
Lafer destacou a importância da reunião em Bragança Paulista ao comentar o papel fundamental da pesquisa científica para o estabelecimento de políticas internacionais de biodiversidade, como as que foram discutidas na COP10 e no âmbito da CBD.
“Os processos de negociação voltados para o tema do meio ambiente e da sustentabilidade são discussões nas quais o conhecimento aprofundado dos assuntos é absolutamente indispensável. Sem essa base de conhecimento e sem uma contínua interação entre os que negociam e os que geram o conhecimento, não é possível avançar nessa área”, disse Lafer, que participou da Rio-92 e da Rio+10 em seus dois mandatos como ministro das Relações Exteriores.
De acordo com Joly, coordenador da reunião em Bragança Paulista, o evento representa a primeira oportunidade para reunir novamente os principais negociadores da COP10. Segundo ele, Djoghlaf, Arienzo, Oren e Dias foram responsáveis por viabilizar a base para o acordo conseguido em Nagoya.
“A partir de agora, entramos em uma nova fase, que consistirá em interpretar corretamente aquilo que foi decidido na COP10. A agenda está completamente voltada para 2012, quando teremos a Rio+20. O objetivo é que, até lá, pelo menos 50 países tenham assinado o Protocolo de Nagoya para que ele entre efetivamente em vigor”, disse Joly à Agência FAPESP.
A preocupação da comunidade científica, segundo Joly, é que não se repita o que ocorreu com o Protocolo de Kyoto, que foi assinado em 1998, mas só entrou em vigor depois da ratificação da Rússia, em 2005.
No caso de Kyoto, o acordo previa a entrada em vigor quando se tivesse a adesão de um número de países que reunisse 50% das emissões mundiais de gases de efeito estufa. O Protocolo de Nagoya estabelece que o acordo entre em vigor quando 50 países o ratificarem.
“É possível fazer com que 50 países ratifiquem o tratado até 2012. Nessas discussões para a implementação do protocolo, novamente o Brasil terá um papel central”, disse Joly.
Outro ponto importante do processo é que os países terão que traçar planos nacionais muito bem definidos para atingir as metas de conservação. “O Protocolo de Nagoya é claro quanto à repartição justa e equitativa de lucros obtidos com o uso sustentável da biodiversidade. Mas é preciso discutir os detalhes sobre o cumprimento de metas. Os planos nacionais terão que dizer como chegaremos a 17% de área protegida e a 10% de área marinha protegida”, afirmou.
No primeiro dia da reunião de Bragança Paulista, os participantes reforçaram que, para fazer o planejamento, os países precisarão estabelecer o custo do cumprimento de metas.
“Suponhamos que se tenha hoje 3% da área marinha protegida. Para subir essa fração a 10%, precisamos saber quais são os mecanismos e recursos específicos para isso. Caso não possamos cumprir no fim do prazo, poderemos avaliar se a meta ficou inviável por falta de esforços ou porque não tivemos os recursos. Isso será definido e é por isso que esta reunião vem em um momento muito importante”, explicou.
Mais do que nunca, será necessária a participação ativa da comunidade científica, segundo Joly. Tanto na definição das estratégias para implementar e monitorar o que será executado, como para fazer as avaliações de custo dessas atividades.
“É preciso abrir um canal de negociação com a comunidade científica. Ficou muito claro para os representantes do MMA que isso é muito importante e que certamente teremos muito com o que contribuir”, disse.
“IPCC” da biodiversidade
A reunião de Nagoya também representou avanços em relação a outra iniciativa importante, da qual o Brasil também participou como protagonista: o Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and Ecosystem Services (IPBES).
O Programa Biota-FAPESP está envolvido desde o início com o longo processo de criação do IPBES, um painel intergovernamental que procura fazer com que o conhecimento científico acumulado sobre biodiversidade seja sistematizado para dar subsídios a decisões políticas em nível internacional.
”Um pouco antes da COP10, em junho, houve uma reunião na Coreia do Sul onde foi finalmente definida a implantação do IPBES. O órgão de fato será implementado. Sua criação foi ratificada em Nagoya e agora o processo depende de uma aprovação na Assembleia Geral das Nações Unidas. Mas uma vez que todos os países já concordaram, ele de fato será criado”, disse Joly.
O órgão terá com a CBD a mesma relação que o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) tem com a Convenção do Clima. “Não é um órgão da Convenção da Diversidade Biológica, mas fornecerá a base técnica e científica para que a comissão tome as suas decisões. Vai facilitar a transferência do conhecimento científico para as políticas públicas”, indicou.
O Brasil tem grande possibilidade de sediar o secretariado IPBES. “Mas, muito mais importante que o secretariado, será o braço do IPBES dedicado a aumentar a capacitação técnico-científica voltada para aumentar a capacidade de conhecimento de biodiversidade. Acho que o Brasil tem todas as condições de sediar esse departamento, ou essa sessão do IPBES”, disse Joly.
Segundo ele, a alta qualidade da ciência feita no Brasil na área de biodiversidade é o fator que aumenta a chance de o país sediar o secretariado do IPBES.
“Temos uma comunidade científica extremamente ativa. A questão central consiste em viabilizar tanto a parte técnico-científica como a financeira. Esse é um compromisso que o país terá que assumir: dar a infraestrutura necessária para esse órgão funcionar”, afirmou.
Mais informações: www.biota2010-targets.com.br
Agência FAPESP