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fapesp-fossiliAnimais surgiram há pouco mais de meio bilhão de anos, mudando para sempre a biosfera da Terra. Foi a chamada explosão cambriana. Em seguida, a predação, a escavação e todos os outros modos de vida disponíveis e característicos dos animais empurraram a evolução em múltiplas direções. Mas os animais não foram os primeiros – e muito menos os únicos – organismos multicelulares. Alguns registros fósseis esparsos indicam a existência de seres que usavam células como seus blocos básicos de sustentação já no fim da era anterior, a Proterozoica, que se estendeu de 2,5 bilhões a cerca de 540 milhões de anos atrás.
Algumas dessas linhagens iniciais ainda existem, como as algas verdes e vermelhas. Mas essa fase extraordinária na história terrestre, que tanto instiga os cientistas, é muito pouco documentada em registros fósseis. A interpretação das raras evidências descobertas até o momento, notadamente de sedimentos mesoproterozoicos (entre 1,6 bilhão e 1 bilhão de anos atrás), tem sido objeto de grande discussão entre especialistas.

Agora, um novo capítulo nesse debate acaba de ser aberto. O motivo é a descoberta de pequenos fósseis conservados em xisto no Gabão, na África. Esses fósseis revelam a existência de organismos maiores e mais complexos que cresceram de maneira coordenada (pré-requisito para a multicelularidade) há pelo menos 2,1 bilhões de anos, ou seja, quase no início da era Proterozoica.

Encontrados em um sítio arqueológico próximo à cidade de Franceville, os fósseis foram considerados de qualidade de preservação inédita para registros do tipo. Na superfície, os fósseis lembram, em sua forma, biscoitos caseiros.

Por meio da análise em tomografia de raio X de alta resolução, os cientistas observaram uma estrutura em espécies de camadas, com um padrão bem organizado de dobras. Os pesquisadores confirmaram que o carbono no tecido fossilizado foi depositado por meio de processos biológicos.

Segundo o estudo, publicado na edição desta quinta-feira (1º/7) da revista Nature, os organismos descobertos teriam vivido em água do mar, em ambiente raso e com pouco oxigênio.

Em comparação com organismos mais simples comuns no início da vida no planeta, tamanhos maiores implicam um modo de vida que demandava mais energia. Respirar oxigênio, como faz o homem, é uma forma mais eficiente de obter energia do que outros processos fisiológicos.

A era Proterozoica teve dois eventos importantes de grande elevação do oxigênio na atmosfera – e, por consequência, nos oceanos: o primeiro próximo ao início da era (entre 2,45 bilhões e 2,2 bilhões de anos atrás) e o segundo no fim (entre 800 milhões e 540 milhões de anos atrás).

Segundo Abderrazak El Albani, da Universidade de Poitiers, na França, e colegas, a evolução dos macrofósseis encontrados no Gabão, que representam um passo inicial rumo à multicelularidade e grandes organismos, pode ter se tornado possível pelo primeiro grande influxo de oxigênio no planeta. A explosão cambriana pode ter sido alimentada pela segunda elevação.

De acordo com os pesquisadores, achava-se que há 2 bilhões de anos a Terra fosse habitada exclusivamente por microrganismos, mas a descoberta dos fósseis no Gabão indica que algo radicalmente novo estava ocorrendo naquele momento: células microscópicas começaram a cooperar entre si de modo a formar unidades maiores, na escala de centímetros.

A principal dúvida que permanece na história da biosfera é por que os organismos multicelulares precisaram de 1,5 bilhão de anos para tomar a frente na evolução terrestre, assumindo papel dominante na biodiversidade.

O artigo Large colonial organisms with coordinated growth in oxygenated environments 2.1 Gyr ago (doi:10.1038/nature09166), de Abderrazak El Albani e outros, pode ser lido por assinantes da Nature em www.nature.com.

Agência FAPESP